Ainda melhor do que parece.
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“Não quero dar uns beijos nela.”
“Espera.” Ele pegou um lápis e começou a rabiscar com entusiasmo numa folha de papel, como se tivesse feito uma importante descoberta matemática, depois se voltou para mim, “Pelos meus cálculos, você é um mentiroso.”
Buda diz que o sofrimento é causado pelo desejo e que a suspensão do desejo implica a suspensão do sofrimento. Se pararmos de desejar que as coisas perdurem, não iremos sofrer quando elas desmoronarem.Miles Halter é um adolescente fissurado por célebres últimas palavras que, cansado de sua vidinha pacata e sem graça em casa, vai estudar em um colégio interno à procura daquilo que o poeta François Rabelais, quando estava à beira da morte, chamou de o "Grande Talvez". Muita coisa o aguarda em Culver Creek, inclusive Alasca Young, uma garota inteligente, espirituosa, problemática e extremamente sensual, que o levará para o seu labirinto e o catapultará em direção às suas mais derradeiras incertezas.
Sempre me causava espanto perceber que eu não era a única pessoa no mundo que pensava e sentia essas coisas estranhas e horrorosas.
Apesar dos pontos na narrativa que exprimem certa iniciação, para uma obra de estreia é mais do que excelente. O autor delineou seu texto de forma crível e forte, não dando aberturas para furos ou itens mal embasados. Senti-me preso do começo ao fim entre as frases que nos imergem na mente de Miles, em seu próprio labirinto de dúvidas e descobertas, em simultâneo ao que o conhecemos e aqueles à sua volta. Há coesão em difundir as más escolhas e os dilemas pertencentes aos adolescentes, não os desmerecendo ou visando-os de maneira menos séria. Um ótimo equilíbrio de fluidez em meio à presença de sua vontade.
Eu conseguia escutar seu sorriso durante a leitura, e o som daquele sorriso me fez pensar que eu poderia gostar mais dos romances se Alasca Young os lesse para mim.
Green aplicou um humor digno de citações seguidas de citações, sempre colocando-o nos instantes mais aproveitáveis; posso afirmar com convicção que fora uma leitura divertida. Ele, aliás, construiu seus personagens com muito cuidado, ao que neles reside a verossimilhança incrível que o livro possui, sem mascarar o que realmente ocorre durante essa fase. Tornei-me amigo dos companheiros de Miles e inimigo de seus opositores; todos moldados de forma adequada em tempo hábil, grande parte fugindo dos estereótipos e - o que mais apreciei - da previsibilidade. Jovens em tal faixa etária como o são, inconstantes, buscando da jornada da vida algo mais, perseguindo questionamentos em um dia-a-dia escolar que não abandona seus elementos característicos.
“Será que as duas pessoas que estão se beijando poderiam ficar quietas, por favor?” [...] “As pessoas que não estão se beijando estão bêbadas e cansadas.”
“Sobretudo, bêbadas.”
Não me parece correto categorizar Miles como protagonista quando a proposta da história não é vê-lo liderar o enredo, porém mostrar como é afetado por seus parceiros de contexto - que é onde entra Alasca. O modo desproposital como o influencia é estimulador de se observar, já que assim como quase tudo na obra as consequências não são presumíveis. Alasca pulsa. Por muitos dita bipolar, sempre é o diferencial no conjunto que eu, como leitor, aprecio ler. Das atitudes inexplicáveis à sua desconstrução por inteiro, vemos a jovem como a ignição tanto do enredo, quanto do Grande Talvez de Miles.
Agradeci [...] e ele me prometeu um sanduíche de ovo um dia desses. Fiquei com medo de que ele quisesse aparecer uma tarde qualquer em nosso quarto com um sanduíche de ovo na mão para nos pegar (a) fumando ilegalmente enquanto [...] (b) bebia ilegalmente seu galão de leite com vodca.
A profundidade do texto sucinta nos meios que o escritor faz tudo parecer corriqueiro, simples, quando lidamos com indagações de considerável complexidade. Esse talvez tenha sido um dos fatores que mais admirei em sua habilidade de escrita, ao implodir significados tão dignos de reflexão e debate em uma roupagem de puro e inventivo entretenimento. Embora deva dizer que o plot twist (reviravolta) foi parcialmente esperado de minha parte. O autor é muito sugestivo nas entrelinhas e não havia como passar desapercebido, porém não nos isenta do impacto do que ocorre e de nossa empatia para com as reações de todos.
Se ao menos conseguíssemos enxergar a infinita cadeia de conseqüências que resulta das nossas pequenas decisões. Mas só percebemos tarde demais, quando perceber é inútil.
Alasca, aquela que dá nome à obra e à concepção em geral, é o tipo de personagem que carrega mais interrogações do que pontos finais em suas aparições. Construída de modo exemplar, ela não tenta ser nada ou ninguém, muito menos si mesma. É intensamente lírica, o que pouco faz sentido, contudo esta é Alasca e não é como se ela estivesse se empenhando em soar coerente. Essa falta de coesões incomodou em certos momentos, não nego, porém concluí que John pôs à prova sua humanidade no quesito de que não teremos todas as respostas que buscamos, inclusive quando procuramos sobre nós mesmos. O mais aterrorizante é que também não teremos todas as perguntas.
“Às vezes, não entendo você” [...]
“Você nunca me entende. Essa é a graça.”
Outro tópico que mixa de maneira interessante diagramação e enredo são as divisões dos capítulos. Trata-se de uma contagem-regressiva inversa até determinado acontecimento, criando um objetivo no ledor de descobrir qual será tal evento para o qual a leitura caminha; uma ideia brilhante para atiçar a curiosidade. A textura da capa é algo entre o veludo e o emborrachado, um dos materiais literários mais confortáveis que já segurei, resistente e não acumula marcas. As páginas também são fortes e a tipografia minimalista é apropriada para a estética sóbria da história.
E, vistas dali, da sala do Sr. Hyde, as coisas realmente pareciam interligadas: as árvores pareciam vestir o morro, e, assim como eu jamais pensaria em reparar num determinado fio de algodão da camiseta regata cor de laranja e esplendorosamente apertada que Alasca estava usando, também não seria capaz de discernir as árvores da floresta – tudo fora tecido de maneira tão intrincada que não fazia sentido pensar nas árvores sem pensar no morro.
Com uma leitura um tanto às cegas, surpreendi-me com o quanto a apreciei. Resta, além de perguntas ao espelho, a vontade de continuar acompanhando figuras tão bem bosquejadas, que com poucas páginas e bastante talento, se tornaram próximas. Sinto em não poder expressar tudo aquilo que a obra me transmitiu e ficar com a impressão de uma resenha desmerecedora - o corriqueiro problema -, por isso aconselho a experiência individual. Além do que creio que ninguém, nem mesmo John Green, seja motivação suficiente para ler esse livro tanto quanto Alasca Young. Ela pode ter uma bagagem de questões, mas tenho certeza que essa ela irá solucionar para você.
“Imaginar o futuro é uma espécie de nostalgia.”
“Como assim?” [...]
“Passamos a vida inteira no labirinto, perdidos, pensando em como um dia conseguiremos escapar e em quanto será legal. Imaginar esse futuro é o que nos impulsiona para a frente, mas nunca fazemos nada. Simplesmente usamos o futuro para escapar do presente”.
Título: Quem é você, Alasca?
Autor: John Green.
Editora: Martins Fontes.
Número de Páginas: 230.
Tradução: Rodrigo Neves.
Tradução: Rodrigo Neves.
Olá, boa noite ^^
ResponderExcluirEstou mega ansiosa para ler esse livro do tio João Verde; também comprei meu exemplar nessa bienal, e desde então quero ler (não sei porque ainda não peguei para ler :S).
Parabéns pela resenha! Fiquei mega curiosa para descobrir mais sobre a Alasca *-*
Obrigada pela dica de leitura.
Beijinhos e bem vindo a Nerdfighteria!
Isabelle - http://attraverso-le-pagine.blogspot.com.br
Olá, Isabelle!
ResponderExcluirPoxa, que bom que gostou da resenha! Espero que leia-o o quanto antes, é realmente uma leitura interessante. Um bjo e volte sempre (:
Olá, Isabelle!
ResponderExcluirPoxa, que bom que gostou da resenha! Espero que leia-o o quanto antes, é realmente uma leitura interessante. Um bjo e volte sempre (:
Oi Caíqueee!
ResponderExcluirAlasca, como não amá-la e odiá-la ao mesmo tempo? O livro é mesmo incrível... No início, como já te falei, não gostei muito e todos os personagens me irritavam, mas depois de um tempo comecei a gostar tanto tanto taaanto deles! Sorte sua que já esperava o "grande acontecimento da história", porque eu fui pega totalmente desprevenida e fiquei meio que eu choque com aquilo, rs. Não esperava mesmo.
A partir daí a história me ganhou de vez, todas as mudanças e coisas em que eles se meteram me prenderam muito. Concordo plenamente com a sua última frase... Só a Alasca já justifica a leitura desse livro, queria conhecer alguém como ela, ou não. hahahahaha.
Resenha incrível, como sempre ;)
Beijos, Nanda
Que bom que gostou tanto, Thaynan!
ResponderExcluirNandaaaaaaa!
ResponderExcluirÉ, acho que esse choque foi mesmo a intenção original de John. Acho que tudo que se passa em high school sempre vai me entreter de alguma forma pelo resto da vida, não tem jeito, é uma fórmula que costuma funcionar comigo quando bem feita xD Ah, eu queria ter todos ali como amigos - não como influência, lógico, sou bom moço! hahaha
Obrigado por sempre opinar por aqui, grande beijo!
Oi, Caíque, tudo bem?
ResponderExcluirLembro que logo que saiu esse livro aqui no Brasil, eu li o primeiro capítulo que a Martins Fontes disponibilizara em seu site e gostei muito. Tive muita vontade de lê-lo.
O tempo passou, li vários outros livros e, não faz muito tempo, li A Culpa É Das Estrelas, também do Green, e não gostei. Pois é, lembro que fiquei meio decepcionado com esse primeiro contato com a literatura de John Green.
É incrível, porém, que toda vez que vejo uma resenha de Quem É Você, Alasca? eu corra para ler e ainda sinta aquela vontade de conhecer a história.
Sei lá, o nome Alasca me instiga, a personalidade dela, bem como você comentou e o garoto Miles, que parece ser um narrador interessante. Sem falar da capa.
Ótima a sua resenha, por conta dela vou tentar ler o quanto antes e voltar aqui pra dar mais uma lida nesse post.
Abraços.
Olá, Elton! Ótimo vê-lo por aqui, rapaz!
ResponderExcluirTenho uma tremenda vontade de ler ACEDE, principalmente por pressões sociais xD Afinal, já ouvi tanto da história e tenho consciência de não que terei a apreciação da grande maioria, mas aprendi a tornar-me curioso pela história - porque não, ela não me chamava a atenção quando foi lançada.
É a primeira pessoa que vejo, aliás, que não gostou dela. Gostaria muito de saber seu ponto de vista!
Também fui instigado por todo essa camada de charada que envolve o livro, espero que logo experiencie e volte pra me dizer o que achou. Obrigado por comentar aqui, volte sempre!
Abraço (:
Confesso que nunca havia me interessado muito por essa história, mas após ler alguns livros do John Green, e que aliás os adorei, comecei a ficar mais curiosa quanto a esse livro, já que se tantas pessoas falam tão bem, tem que ser bom mesmo, né! Adorei a sua resenha, e você conseguiu me deixar mais curiosa ainda pra finalmente ler esse livro e descobrir se tenho a mesma opinião que a maioria, hahaha
ResponderExcluirxx Carol
http://hangoverat16.blogspot.com.br/
Felicito-me em saber que gostou da resenha, Carol!
ResponderExcluirPreciso e quero ler outros livros do John o quanto antes, principalmente "Cidades de Papel" e ACEDE, dos quais mantenho uma forte curiosidade.
Espero, então, vê-la em breve falando de Alasca e cia. no Hangover, obrigado por sempre comentar, um bjo (-: