Anne Elliott, integrante de uma sociedade onde a mulher tem o casamento como obrigação social, encontra-se solteira aos vinte e sete anos de idade. Aos dezenove, chegou a receber uma proposta do Capitão Wentworth, por quem nutria profundos sentimentos de afeto e paixão, mas acabou sendo persuadida a não aceitar a oferta. Oito anos depois, o pai de Anne tem de mudar-se devido a problemas de ordem financeira, e a família decide deixar a casa antiga, encontrando moradores dispostos a alugá-la. Os inquilinos revelam-se como o Almirante e a Sra. Croft - sendo esta última a irmã do mesmo Capitão Wentworth por quem Anne foi, um dia, apaixonada. A reinserção do capitão em seu círculo social afeta a estrutura psicológica de Anne, incerta quanto à total supressão dos sentimentos nascidos há quase uma década.
Persuasão foi a minha primeira experiência literária bem-sucedida com o admirado trabalho de Jane Austen. Fracassei quando tentei perscrutar a robustez de Orgulho e Preconceito, atingindo-lhe a essência encantadora; mas, decidido a conhecer a fundo a produção de tão renomada romancista, optei por não desistir tão facilmente, e pus-me a ler a obra mais introspectiva de Austen. Não foi nenhuma experiência catártica e eu ainda não consegui detectar a ironia que muitos apontam como principal característica da autora, mas Persuasão certamente abriu-me os olhos para um outro tipo de enredo, calcado no jogo de aparências e no conflito entre a visível serenidade e o turbilhão interior.
Estava persuadida de que por maiores que fossem as desvantagens da desaprovação familiar e por pior que fosse a incerteza acerca da profissão dele e todos aqueles prováveis medos, atrasos e decepções, ela teria sido uma mulher mais feliz se mantivesse o noivado do que era tendo-o sacrificado.
Persuasão é uma obra de caráter introspectivo, a partir do qual as personagens não são tratadas em conjunto, mas sim como indivíduos dotados de dúvidas e imperfeições. Respeitando os limites de sua usual sensatez, não ousando pisar tão fora da sua zona de respeitabilidade e moderação, Jane Austen descreve cada um desses conflitos internos com agradável habilidade literária, permitindo que seus leitores tenham duas visões de cada cena: a primeira, externa e superficial; e a segunda, na qual são levados em conta os precipícios que habitam a alma de todos nós. Anne, a protagonista do romance, é capaz de despertar sentimentos simultâneos de compaixão e raiva. A sua atitude passiva e resignada, conquanto típica do meio social no qual se encontra, não raro a impede de vivenciar momentos de euforia e de decisão; é comum que Austen provoque seu leitor dizendo que Anne tinha grande desejo de fazer algo, mas era obrigada a suprimir seus ímpetos.
Embora eu não possa discordar da base sobre qual se sustentam as críticas de Charlotte Brontë ao trabalho de Austen, confesso que a atmosfera criada pela autora me envolveu com muita naturalidade. Em nenhum momento é deixado de lado o peso dos grilhões da sociedade, mas, apesar disso, a leitura transcorre com fluidez e leveza. A história é previsível e certamente perderia todo o seu encanto sob a pena de um autor menos experiente e habilidoso; há algo no estilo de Austen que torna a trajetória quase adolescente de Anne muito interessante, embora eu tenha imprecisão em determinar o quê. Sinto como se a seriedade literária da romancista se elevasse sobre a trama como um todo, garantindo ao livro a maior parte de seu poder. Digamos assim: não me encantei com Persuasão. Encantei-me com Jane Austen.
Ela o compreendeu. Ele não podia perdoá-la, mas não podia ser insensível. Embora a condenasse pelo passado e o julgasse com profunda e injusta mágoa, embora sem nenhum interesse por ela e embora começasse a gostar de outra, ele não conseguia vê-la sofrer sem desejar reconfortá-la. Era o que restava de um velho sentimento; era um impulso de puro, embora não reconhecido, bem-querer; era uma prova de seu coração ardente e terno (...)
A minha expectativa pessoal é que muitas leitoras identifiquem-se com a figura de Anne. Circunspecta e frequentemente ofuscada pela figura imponente da irmã, a protagonista foge à perfeição de Elizabeth Bennet, principal figura de Orgulho e Preconceito, e consolida-se em sua própria personalidade tímida. Perspicaz em seu silêncio, Anne pode ser uma figura inspiradora se observada do ângulo certo, embora também seja possível lamentar-lhe a frequente submissão. Enquanto a obra de Austen permanecer lida e comentada, contudo, alguém torcerá por Anne. Alguém desejará a sua felicidade. Alguém lhe entenderá os motivos confusos.
E é por isso que Persuasão é uma leitura que vale a pena. Além de se tratar de um clássico da literatura inglesa, a obra é permeada por questões dignas de nota: a diferença entre as reações masculina e feminina ao amor; o conflito entre obrigações sociais e desejos internos; a persuasão em si; a vaidade e o jogo de aparências. A olho nu, a história pode soar desinteressante e até beirar o lugar-comum; em uma camada mais profunda, contudo, Austen retira de sua manga cada uma das habilidades adquiridas ao longo de sua trajetória literária. Como não apreciar um autor no auge de sua maturidade?
Título: Persuasão.
Autora: Jane Austen.
Editora: Bestbolso.
Número de Páginas: 256.
Avaliação: 4 de 5.
Robledo,
ResponderExcluirgostei muito da sua resenha de Persuasão. É um prazer ver os jovens apreciarem esta obra madura e às vezes melancólica de Jane Austen.
um abraço,
Sou suspeita pra falar de Jane Austen porque sou super fã. Fico imaginando o que vou fazer da vida depois que terminar de ler todos seus livros! D:
ResponderExcluirPersuasão é meu segundo favorito, até agora, atrás apenas de Orgulho e Preconceito. Apesar de tudo que Anne passa, a gente fica torcendo! Fiquei super agoniada durante a leitura, com medo de um final "não tão feliz"...
Beijos,
Miriam - Booker Queen!
Eu nunca li os livros dessa autora, mas quem sabe eu não o leia um dia.
ResponderExcluirOi, Robledo!
ResponderExcluirPersuasão nunca foi uma opção de leitura minha. Se tratando de Jane Austin, claro, os títulos que mais me interessam de cara, além de Orgulho e Preconceito, são Emma e Razão e Sensibilidade (leitura esta que estou realizando no momento).
Jane se mostra astuta e perspicaz tratando de temas tão reflexivos e ambíguos, nos proporcionando uma melhor avaliação e comparação acerca do tema em relação à era em que foi escrita e a atualidade. Notas dignas e bem postas, na qual nos mostramos prazerosos em ponderar.
Gostei bastante. É tanto que até estou repensando sobre a leitura dessa obra...
Parabéns pela resenha.
Um abraço!
http://universoliterario.blogspot.com/
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirJá li Orgulho e Preconceito, que por sinal adorei,e virei fã de Jane Austen. Há tempos venho enrolando com Persuasão na minha estante, gostei muito da sua resenha,a assim que terminar A Menina que Roubava Livros, lerei Persuasão.
ResponderExcluirOi Robledo!
ResponderExcluirPretendo ler esse livro ainda esse ano, porém a razão pelo qual ele nunca foi um dos meus preferidos na lista da Austen é justamente essa submissão da personagem, que é oprimida por causa das suas obrigações sociais, que opta pelo que é bem visto aos olhos da sociedade, em detrimento daquilo que sente no seu íntimo! Acho isso tão irritante e de certa forma covarde, que meio que reluto sua leitura. Sinto que vou ficar indignada, mas sei que acima de tudo irei torcer pela felicidade da Anne! É, eu adoro finais felizes!
Acho que depois de Orgulho e Preconceito, esse é um dos mais bem conceituados da autora, isso me deixa curiosa, fora que concordo com você, Jane Austen parece está no melhor da sua forma quando o escreveu, inclusive se não me engano, esse foi o último livro escrito pela autora, então imagino que a narrativa seja um show à parte, e até o que chama mais atenção no livro de um modo geral!
Beijos
Olá, adorei sua resenha. Ficou perfeita. Adoro este livro e sou super fã da Jane Austen.
ResponderExcluirAbraços e sucesso!
Lia Christo
www.docesletras.com.br
Olá!
ResponderExcluirGostei muito do seu blog, estou seguindo ele, se gostar do meu blog siga-o também, isso se não for problema a você!
Beijos e uma ótima semana!
@AngelKiller_
http://anime-daiki.blogspot.com.br/
Olá meninos, quanto tempo não passo por aqui né???
ResponderExcluirAdorei a resenha. Ainda não li nenhum livro da famigerada Jane Austen, mas sou louca para conhecer a sua obra. Descobri a historia de Persuasão e já me encantei. Fiquei preocupada com o comentário sobre Orgulho e Preconceito, mas nada que vai me impedir de ler (sou persistente).
Espero que eu possa ler os livros em breve e pretendo ler todos.
acho ridículo uma pessoa apontar a menor falha com o trabalho de Jane . O senhor deveria saber ler com mais atenção pois a ironia é tão presente que até uma criança a entende , ou talvez não queira se dar o luxo de admitir o quão estupendo é o mundo em que Jane Austen inventou . Ou pior que todos esses tópicos , o senhor não tem conhecimento do quanto ela revolucionou a literatura , decididamente a pessoa que escreveu essa resenha é tola e ignóbil . Para escrevermos sobre qualquer coisa precisamos conhecer , pelo visto o senhor não se deu ao trabalho de ler com mais atenção .
ResponderExcluirOlá, Letícia!
ResponderExcluirBom, apesar do seu comentário com um desnecessário apelo agressivo, não vejo problema algum em respondê-lo. O Robledo Filho, fundador deste blog, foi o leitor e resenhista de "Persuasão" e ele saiu do blog no meio do ano, logo, não posso falar muito sobre sua respectiva opinião acerca do livro, além do especificado na análise acima. A censura é um ato terrível, mas por estar determinado que não aceitaríamos quaisquer tipos de ofensas a leitores e/ou resenhistas ("a pessoa que escreveu essa resenha é tola e ignóbil"), darei um prazo para que leia esta resposta e após isso estarei excluindo-o.
O Robledo sempre foi muito preocupado com que redigia e o que encontrou de positivo e negativo na obra de Austen é de responsabilidade e opinião totalmente dele; devemos respeitar o gosto e as impressões de todos.
O que você poderia ter feito era deixar aqui a sua opinião sobre a resenha, o livro e a autora sem atacar ninguém verbalmente, seria o mínimo da educação que se espera em qualquer discussão civilizada sobre algum assunto.
Enfim, aguardo sua próxima visita, com um pouco mais de educação e noção do que está escreve, aguardo de verdade.
Obrigado pelo comentário!
está escrevendo*
ResponderExcluirRobledo, pesquisando sobre Persuasão, achei seu blog. Adorei seus comentários. Confesso que me identifiquei de cara com a história, em papéis invertidamente colocados para a heroína-(tímida-submissa-covarde) Anne, ao deixar-se levar por opiniões sociais e da sua "tutora" aos 19 anos de idade, e para a alma destruída de Frederick, o bem-amado "rejeitado" do passado... Comigo foi o contrário mesmo: eu, total e perdidamente apaixonada, fui rejeitada (motivo: amor não correspondido? conveniência para ele?), aos exatos 19 anos, assim como a Anne de Jane Austen. Idade muito jovem, imaturidade, contraponto com maior experiência de vida do meu "Frederick" deste passado cruel que me habita até hoje. Minha alma ainda está dilacerada, ainda está destroçada, mesmo passados 17 anos após minha breve história de amor. Mesmo tendo seguido minha vida, longe deste passado (outra cidade, outro companheiro, filhos, carreira, trabalho), ainda assim mantenho as mesmas e diárias reflexões, sempre me perguntando sobre os "e se"s todos que, a cada vez que leio ou assisto alguma história de amor... Volto a me perguntar... "E se fosse... (de um jeito)...?". "E se tivesse acontecido ... (de outro modo)?". "E se eu tivesse lutado por ele?"... Enfim... Fico agora me perguntando se realmente estas histórias de amor contadas pelos maravilhosos autores ingleses, (quase) sempre com finais felizes, realmente existem. Enquanto isso, vou sonhando, esperando, talvez, um dia, sair esta tormenta do meu corpo, do meu coração, da minha mente. Espero que venha algum dia ler este comentário. Atenciosamente, M.M.
ResponderExcluirVocê escreveu tudo o que eu tentei escrever e não consegui em relação a esta obra. Persuasão foi o primeiro contato com Miss Austen mas de cara me apaixonei pelo jeito de escrever e pela história dela. Essa é a última obra de Jane e isso me fez ver uma magia, pois foi o primeiro dela que eu li e sempre vai ser meu favorito.
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