Não adianta idealizar o romance mais brilhante de todos os tempos e não ter o pique necessário para escrevê-lo, reescrevê-lo, editá-lo e reeditá-lo.
Fonte: pinterest.com/sleeplessreader/fellow-readers/ |
José Saramago afirmava que, se escrevesse uma lauda por dia, teria um romance ao cabo de um ano. A declaração do escritor, o único da Língua Portuguesa a ganhar o Nobel da Literatura, pode servir como argumento a favor da velha afirmação de que a produção artística exige 10% de inspiração e 90% de transpiração - uma combinação de percentuais que, na maioria das vezes, faz a desistência parecer um caminho muitíssimo afável.
Para que uma boa história seja transmitida às linhas de um caderno ou às páginas em branco de um editor de textos, a resistência físico-mental é quase tão importante quanto a formulação do enredo em si. Em poucas palavras, não adianta idealizar o romance mais brilhante de todos os tempos e não ter o pique necessário para escrevê-lo, reescrevê-lo, editá-lo e reeditá-lo. Ainda que a Literatura seja um ofício de cunho artístico, há uma grande quantidade de trabalho braçal envolvida, e o estabelecimento de uma rotina de escrita é, indubitavelmente, uma boa estratégia no caminho da concretização do sonho da publicação.
Os escritores dividem-se em um sem-número de correntes de pensamento: há aqueles que acreditam que um aspirante a romancista deve-se obrigar a redigir, no mínimo, duas mil palavras (ou mais) por dia; outros preferem crer que o ideal é separar uma parte do seu dia - o alvorecer, por exemplo - e dedicá-la unicamente à produção textual, independentemente da extensão do conteúdo gerado. Parece haver, entretanto, uma espécie de consenso: os grandes poetas, cronistas e contistas frequentemente asseveram que o triunfo sobre as estruturas de uma Língua está intrinsecamente relacionado ao convívio frequente com tal entidade. Em outras palavras: antes de querer viver de Literatura, entregue uma parte de sua vida a ela.
Só se aprende a escrever de uma forma: escrevendo.
Confesso que não tenho a disposição necessária para separar uma hora diária para a produção de contos, por exemplo. O meu intelecto funciona de maneira diferente, e a consciência dessa diferença permitiu que eu procurasse estímulos e desafios particulares; em vez de escrever quatro laudas por dia, eu busco simplesmente não passar um único dia sem redigir nada. Se tenho interesse em aperfeiçoar o meu Inglês, por exemplo, envio um e-mail formal para o dono de um blog estrangeiro que admiro; se não tenho a imaginação para um conto, sento-me à frente do painel do Blogger e idealizo um artigo para o Livros, letras e metas. Em verdade, as possibilidades de praticar a escrita são quase ilimitadas, além de serem uma estupenda alternativa ao tédio.
Falamos, certa vez, sobre a atenção que alguém que deseja ser escritor deve destinar às obras dos grandes mestres. Entretanto, não é nem um pouco útil granjear uma bagagem imensa de conhecimento literário e jamais colocar seus aprendizados em prática. A partir do treinamento constante e da autoestimulação ininterrupta é que surgem as chances de fixar o que você absorveu das leituras que fez. Quando escrever torna-se um hábito tão natural e inevitável quanto escovar os dentes, as oportunidades multiplicam-se exponencialmente, e você amadurece com sutileza e tranquilidade. Compare seus parágrafos de hoje com aquilo que você produzia há cinco anos. Percebe melhoras? Seus períodos provavelmente fluem com mais facilidade e coesão, simplesmente porque você praticou suas habilidades e conviveu com pessoas mais experientes. Criar uma rotina de escrita é amplificar e potencializar essa melhora, tornando-a deliciosamente tangível.
Não sabe por onde começar? Crie um diário ficcional! Ouça músicas e escreva pequenos contos baseados em suas letras. Melhor ainda: ouça instrumentais e permita que os parágrafos surjam - cautelosos, inicialmente, mas logo logo desinibidos. Escreva uma carta ao seu futuro eu, ou à criança que você foi um dia. Leve a caneta ao papel e melhore. No fundo, no fundo, você sabe tão bem quanto eu que a dificuldade não é escrever; é começar a escrever.
Não sabe por onde começar? Crie um diário ficcional! Ouça músicas e escreva pequenos contos baseados em suas letras. Melhor ainda: ouça instrumentais e permita que os parágrafos surjam - cautelosos, inicialmente, mas logo logo desinibidos. Escreva uma carta ao seu futuro eu, ou à criança que você foi um dia. Leve a caneta ao papel e melhore. No fundo, no fundo, você sabe tão bem quanto eu que a dificuldade não é escrever; é começar a escrever.
O diário de Charlotte Brontë é uma coluna sobre os deliciosos pormenores do hábito de escrever. Tem alguma sugestão temática? Gostou deste post? Quer simplesmente saber mais sobre a vida da nossa querida Charlotte? Deixe seu comentário ou envie um e-mail para livrosletrasemetas@gmail.com!
Ótimo post, Rob! Tenho ideias, mas me falta esse "pique". Se o tivesse, com certeza teria mais sonetos... '-'
ResponderExcluirO Wil todo dia se obriga a escrever... E eu penso que não é um modo saudável, embora as coisas funcionem. Porque não funcionam muito bem. o.O
Sou a favor da inspiração. Mas dessa forma eu creio que nunca escreveria um livro inteiro...
Complicado.
Esse "não funcionar muito bem" é o meu principal argumento contra um mínimo de palavras ou laudas por dia, Tars! Nós não temos o mesmo pique sempre: há vezes em que queremos apenas escrever três linhas cheias de metáforas, e há ocasiões em que sentimos o ímpeto de escrever uma história policial de quinze páginas. Por isso, na minha opinião, escrever, por si só, já é suficiente. Não importa o tamanho da sua produção; basta que ela seja exista e seja regular.
ExcluirBeijão, companheira dos clássicos!
Ótimo texto! Esse ano eu decidi começar a escrever ao invés de só ficar lendo. Comecei com a criação de um blog, e acho que estou me saindo muito bem. Não só melhorei minha escrita com apenas dois meses da sua existência como também estou me divertindo bastante com ele.
ResponderExcluirNão tem muita coisa a ver com isso, mas também iniciei um pequeno vlog para aprender a falar direito, espero que este dê certo também.
Agora só falta pique para começar um diário físico, pois ando digitando tanto que escrever à mão está se tornando cada vez mais entediante...
Interessante, Lizzie! A criação de um blog, além de um excelente exercício de escrita, é uma tática bastante eficiente contra a timidez. Quanto ao vlog: eu também tenho pretensões de melhorar a maneira como falo, mas acho que não teria coragem de postar vídeos dessa natureza regularmente... De qualquer forma, certamente vou ao seu blog conferir o seu trabalho!
ExcluirGrande beijo e obrigado pelo comentário!
Concordo com você, Lizzie. Estar ativamente em um blog literário só enriqueceu minha escrita e incentivou para que eu falasse e escrevesse melhor fora do blog também. E foi isso que o Robledo falou, conhecemos tanta gente com os mesmos interesses e gostos, e até pessoas totalmente opostas a nós, mas que são bem legais mesmo, logo estamos sempre aumentando nosso círculo de amizades. Quanto tempo livre hein! Blog, vlog, diário, haha. Mas siga em frente com seus projetos sim, parabéns! Estou começando a pensar em fazer isso de escrever, que seja uma página por dia, parece que dá bastante resultado. Eu gosto de me dedicar inteiramente a um projeto, e gostaria de me dedicar ao meu livro, mas só a ele, e isso não tem sido possível, por isso não escrevo e só faço o "esqueleto" do enredo, mas já é alguma coisa né :D
ExcluirXD Pois é, Caíque, passei ano passado no vestibular mas as aulas só começam no segundo semestre, e como não tenho dinheiro para viajar durante esse tempo, vamos fazer algo produtivo! Chegarei lá se não preparada ao menos com uma boa bagagem ^^
ExcluirE boa sorte com o seu livro! Uma página por dia é um ótimo começo, daqui a algum tempo já estará escrevendo a história direitinho :)
Nossa! Adorei a postagem e tudo. Isso me fez pensar em várias coisas no meu dia a dia e como escreve e ouvi é importante. Como por exemplo a leitura nos faz cresce e melhora a nossa escrita. Nem sei o que escreve, pois não tenho palavras para a sua postagem.
ResponderExcluirAmei!
É realmente um tema que faz a gente pensar, não é? Eu já vi escritores dizendo que acordavam cedo (tipo às 6 da manhã) e ficavam até a hora do almoço, enclausurados, escrevendo... Essas rotinas servem como prova perfeita de que, no final das contas, escrever não é tão fácil assim. Exige tanta disciplina quanto qualquer outra atividade cujo objetivo seja o sucesso!
ExcluirOi *-* Adorei a coluna e o tema! KKKK
ResponderExcluirEu fico nessa de tentar escrever algo e as vezes sai tanta coisa boa de uma vez... E depois... pft, mais de um mês sem uma linha decente! ;x
Adorei mesmo o texto, de verdade, eu li tudo mas não tô conseguindo escrever direito hoje -como já falei, tá complicado, rs-, só estou comentando pra registrar NESSE POST que eu realmente gostei muito da coluna e da ideia para o texto :))) (Estou repetitiva? kkkk)
Beijos, Nanda
www.julguepelacapa.blogspot.com
Eu costumava ser igual a você, Nanda! Escrevia uma coisa hoje, e esperava meses e meses até que a inspiração batesse à minha porta e eu sentisse vontade de sentar e redigir. Entretanto, depois de um certo tempo (e de um desafio literário que eu explico em outra ocasião), percebi que eu também tinha condições de produzir coisas legais sob pressão! Pode parecer uma ideia assustadora no começo, mas, depois que você se acostuma à realidade de que está fazendo aquilo em prol de você mesmo, uma rotina de escrita passa a parecer algo muito mais atraente.
ExcluirE não se preocupe quanto a estar repetitiva, haha. É sempre bom ver que vocês apreciam o trabalho que a gente faz! Beijão!
Oi Robledo!
ResponderExcluirCertamente, definiria o texto dessa coluna como 'inspirador'. Apesar de não ter a intenção de publicar nada, as vezes contento-me em escrever esporadicamente para mim mesma, uma forma de expressar alguns pensamentos pessoais.
Gostei da ideia principal da coluna e achei a referência à Charlotte uma ótima ideia!
Grande abraço!
Lygia - Brincando com Livros
Obrigado por sua visita e seus comentários, Lygia!
ExcluirTenho um interesse particular pela vida da Charlotte (e de suas irmãs), e não pude deixar de transmitir esse sentimento à coluna. E eu realmente espero que alguém, ao se deparar com um texto dessa seção, pergunte a si mesmo: quem é essa tal Charlotte Brontë? Por que o pessoal desse blog decidiu homenageá-la desta forma? Caso eu receba um único e-mail com perguntas sobre a escritora, já me sentirei satisfeito!
E faz você muito bem em escrever para você mesma. Acho, inclusive, que sigo a mesma linha. A preocupação não é produzir um texto que agrade a gregos e troianos, mas sim algo que traduza aquilo que sentimos, pensamos e idealizamos no momento.
Um abraço!
Menino, eu iria comentar aqui no feriado, mas por algum motivo não o fiz, - provavelmente foi a droga da minha internet que me impediu.
ResponderExcluirEu estava conversando com uma amiga esses dias que pra mim, a parte mais sofrida de escrever, é revisar o texto, e re-editar, diversas vezes, isso me cansa e no fim, me desanima.
Eu sei, é triste isso, mas fazer o quê? A minha preguiça fode comigo. (com o perdão da palavra)
E sim, acho que além dessa parte técnica de revisão, o pior de tudo é começar a escrever!
Obrigada pela ajuda lá no blog, você é um amor! *_*
P.s: queria fazer um pedido, tem como liberar o campo NOME/Url? Fica mais fácil pra comentar!
Obrigada!
Um Beijão!
Camila Leite
@sonhospontinhos
www.sonhosentrepontinhos.com
A preguiça é o maior problema mesmo, Camila... Quando somos invadidos por aquela sensação de tédio, é difícil arranjar uma motivação que seja capaz de nos fazer levantar e colocar a mão na massa. Mas eu realmente acredito que rotinas de escrita são uma boa solução para o caso! A única dificuldade é acostumar-se a elas!
ExcluirHabilitei a opção de comentar por Nome/URL! Jurava que ela já estava habilitada, na verdade, haha. Muito obrigado pelo toque e boa sorte na sua busca por colunistas! Beijo!
A Preguiça é, de fato, o maior problema, Robledo. Só cliquei aqui no responder porque a internet zicada não deixa o formulário de comentários aparecer de outra forma, ok? Você sabe que eu adoro o que você escreve e esta coluna não foi exceção. O que dizer? É fato. O trabalho pesado, o hábito de escrever, a revisão e pesquisa são fundamentais no processo de escrever. Ou seja? SEEM PREGUIÇA! Preguiça deve passar longe. Por isto admiro tanto quem escreve um livro. Qualquer que seja. Tem que ter uma persistência tão monstruosa para tudo dar certo, nossa. Amei o post <3
ExcluirBeijones,
Rachel Lima
http://corujando.org
Jovem Robledo. Li o que postou aqui em seu Blog e também o que comentou no Blog de sua amiga Ana. É isso que eu chamo de escrever bem, de ter atitude, de pensar e questionar. Sua opinião, pode ter certeza, foi a mais lúcida que li nestes últimos dias. Reflete o que gostaria de encontrar nos Blogs dos jovens. E se a encontrasse antes, talvez nem tivesse escrito aquele texto para o Portal Literal. Por causa de jovens como você é que não generalizei meu desabafo. Tanto que falo em MAIORIA e nunca em TODOS; tanto que peço no artigo para "Mas para aqueles que têm maturidade, peço humildemente, que tenham a paciência de ler o que eu li em alguns Blogs... e digam-me depois se estou sendo reacionária". Você foi capaz de compreender e sugerir uma discussão madura sobre a questão. Havia sugerido isso a sua amiga Ana, mas ela DELETOU meu comentário (diga a ela que isso é "dirigir as informações para o que se quer informar e não para o que se deve informar", da mesma forma que ela me acusa em seu artigo de tê-lo feito no meu). Quanto aos "clássicos" você, me parece, que foi a única pessoa que compreendeu o que eu quis dizer. "Lolita" é um clássico sim, mas não seria, como você sensatamente afirmou, um livro que analisaria ou recomendaria para os jovens agora. Quando falo em clássicos, falo sobre qualquer um, seja ele escrito no século XIX ou no século XXI. Falo de livros que acrescentam e agregam. Esse é o meu conceito de clássicos. E realmente o que me aborreceu ao ler Blogs literários foi a supervalorização de romances( na maioria estrangeiros) que não agregam e nem permitem o crescimento (até mesmo no vocabulário) consciente. Meu artigo teve um propósito: levantar a discussão entre vocês, de maneira sadia, inteligente e lúcida e você conseguiu transmitir com a linguagem de um jovem em seu comentário o que eu gostaria de ouvir e ler. PARABÉNS. Adoraria que você publicasse esse seu comentário no PORTAL LITERAL. Ele é necessário. Acredito que muito mais necessário do que meu artigo que desencadeou essa discussão.
ResponderExcluirCordialmente, meu querido.
Concordo com as suas palavras, Robledo! Por mais que eu tenha um blog e exercite esse meu lado escritora constantemente seja através dele ou de qualquer outra coisa que produza fiquei pensando nas inúmeras vezes em que me imaginei escrevendo algo diferente, algo para mim e não coloquei esse texto em prática? Não que vá sair uma obra prima literária disso, mas apenas quando nós vencermos essa resistência é que iremos conseguir progredir e realmente obter algum resultado! Valorizo muito o trabalho dos escritores, engraçado imaginar que tem gente que pensa que basta apenas sentar e escrever! No fundo é muito mais do que isso, exigindo um nível muito maior de disciplina e concentração do que se pensa à primeira vista.
ResponderExcluirBeijos