sábado, 29 de outubro de 2011

Leitura: preconceito sem conceito

Qualquer pessoa que mantém uma linha de leitura razoável já deve ter notado a mudança de comportamento daqueles ao seu redor no momento em que está lendo. Olhares acanhados, para a capa ou mesmo para o conteúdo, as pessoas olham como algo novo e desconhecido, como se os livros fossem algo raro e estranho no contexto cotidiano. A realidade é que o brasileiro não está acostumado a este grupo maciço de leitores, que vem crescendo cada vez mais. E a grande questão é: por quê?

Devido a uma questão de cultura, a maioria brasileira criou uma imagem distorcida do ato da leitura, como uma ação maçante e chata, o que acaba a repelindo deste hobby tão prazeroso. Digo isso falando de grandes massas, entretanto uma família de qualquer condição social, se incentivar uma criança desde pequena a ler, tudo seria bem diferente. Mas vejam bem, estamos falando de pais e mãos que também não tiveram acesso aos livros quando pequenos, crescendo sem conhecer a verdadeira literatura.

Antigamente, quando ainda não tínhamos a facilidade de todo o aparato tecnológico ao nosso favor, os livros tinham um espaço muito limitado na mídia em geral, e para saber, por exemplo, quando algum livro iria ser lançado, o leitor teria que ir até a editora e procurar a informação. Tudo isso contribuiu para esta característica negativa de repelência à leitura do brasileiro. Com certeza você já ouviu coisas como “Ler é muito chato”, ou “Não tenho paciência para isso, não”, provando que o preconceito aos livros tomou proporções preocupantes, já que isso é tão comum de se ouvir. Contudo, em pesquisa do Ministério da Cultura, o índice de leitura no país cresceu mais de 150% nessa primeira década do século, isso demonstra uma evolução. Pequena, mas considerável.

Pensando ainda mais atrás na linha do tempo, ficamos sabendo que as bibliotecas eram vistas como recintos para pessoas importantes, sérias, cultas, nunca como um local onde qualquer um poderia entrar e pegar um livro para se distrair, logo, esta prática tupiniquim anti-leitura vem é mais antiga do que se imaginava. Mas desde então, havia aqueles que se recusavam a aceitar de braços cruzados essa infeliz realidade, e atualmente suas obras são chamadas de “clássicas”. Machado de Assis (“Dom Casmurro”), José de Alencar (“O Guarani”), Castro Alves (“Navio Negreiro”), e muitos outros mestres da grande literatura brasileira que você deve conhecer por ter lido uma obra na escola - ou até por vontade própria mesmo – mostraram que não só de ler o jornal vivia o homem e nem só de fofocas faladas vivia a mulher.

Toda essa generalização de assimilar a leitura a hábitos torturantes foi sendo disseminada com o passar do tempo, mas ainda está firme e forte no Brasil, onde uma porcentagem infima lê se quer um livro por ano. Só no Brasil, estima-se que foram vendidos 3 milhões de exemplares da série Harry Potter, dos 400 milhões ao redor do globo. Acredite, se você lá leu pelo menos mais de três livros este ano, está excedendo as expectativas! Esse preconceito não só aflige a imagem e a realidade cultural do país, como implica na vida dos leitores, pois a falta de procura reflete-se no preço dos livros em geral. Enquanto nos Estados Unidos eles são tão baratos que você pode comprá-los em qualquer lugar, até mesmo um por dia com o troco do supermercado, no Brasil você tem que juntar o mês inteiro para comprar determinado volume. A pirataria ainda não atingiu essa área, mas os e-books e as traduções não-oficiais pela Internet estão aí para facilitar a vida de quem não tem condições de gastar tanto assim numa livraria.

A leitura é importante até para a criação do caráter humano, e creio que se fosse investido – e acredito que em breve será – diretamente na educação, teríamos respostas positivas em diversas áreas. Quando falam que “ler faz a gente escrever melhor”, não é apenas uma frase decorada, é a mais pura verdade. Há recentes experiências em minha própria vida de pessoas que estão mudando gradativamente seu comportamento e aproveitamento em sala de aula por causa da leitura. Ficam mais tranquilas, pensam melhor e refletem mais sobre os próprios atos, e a tendência é só melhorar. Ler é uma ferramenta básica e fundamental para formar um cidadão exemplar.

Não é possível fazer alguém de uma hora para outra, “engolir” livros de George R. R. Martin, ou pedir que entenda em uma só lida o primeiro capítulo de “O Senhor dos Anéis”, mas uma dosagem remediada faz toda a diferença. Jornais, revistas, crônicas, matérias na Internet, blogs; tudo isso está à disposição do leitor para fazê-lo se interessar ainda mais pelo ato de ler, para que perceba o quanto lhe será agradável e proveitoso. E nós, blogueiros literários, não devemos nos limitar aos posts e resenhas para espalhar essa cultura, devemos agir. Quantas vezes você acabou de ler um livro e pensou que ele seria perfeito para alguém conhecido? Creia nisso: o primeiro passo é altamente aconselhável.

Ler foi o motivo da blogosfera literária existir, foi o motivo deste blog existir, e foi o motivo de eu escrever isto agora e você estar lendo. A origem de toda resenha, de toda wishlist, de todo evento literário, de toda promoção do Submarino, é um preconceito tão forte quanto o racismo e a diferença de classes. Sei que isso pode aparentar altruísmo e até mesmo clichê - e me perdoem por isso, sinceramente - mas e quanto ao que nós estamos fazendo para mudar isso? Somos bombardeados com notícias de quanto o Brasil está crescendo economicamente, sendo cotado para eventos esportivos de prestígio, por que não fazê-lo ser reconhecido por ter uma população ativa de leitores? Afinal, hoje (29) é o Dia Nacional do Livro, e não é só por música e futebol que o nosso país é reconhecido. 
É também pelas páginas.

13 comentários:

  1. Apoiado. Assino embaixo.
    Reconheço que há um certo egoísmo quando compro uns 6 livros de uma vez, por mês, no Submarino, e os empilho na estante sem previsão de leitura; tudo isto para alcançar uma meta pessoal de tantos livros por ano.
    Por outro lado, colegas da escola sequer estão lendo os livros pro vestibular! Eu sozinha não vou mudar as estatísticas de leitura no país, e eu já conheço todos os benefícios que ela pode nos trazer. Já passou da hora de fazer alguma coisa.
    Aqui, no meu círculo de amizades, tem uma regra pré-estabelecida: sempre damos livros de presente de aniversário. Aí é mais fácil, sabemos que vamos agradar. Mas quando é outra pessoa que eu conheço, e eu quero dar certo livro de presente, fico receosa, justamente por achar que o volume vai ficar encostado! Como é que alguém poderia não querer um livro de presente? =/
    Caíque, foi uma ótima sacudida. Agora que expomos o problema, podemos começar a procurar soluções.

    Beijos,
    Miriam.
    bookerqueen.blogspot.com

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  2. "como uma ação maçante e chata" Eu já ouvi gente falar que ler é muito cansativo, pode isso? É o cúmulo O.o

    "e muitos outros mestres da grande literatura brasileira que você deve conhecer por ter lido uma obra na escola" Ás vezes também as pessoas não gostam de ler, por causa desses livros que são obrigados a ler na escola e acham muito chatos, e daí depois dessa experiência nada legal, desistem da leitura.

    Eu simplesmente adorei o post e concordo plenamente com o conteúdo.
    Sinceramente são vergonhosos os índices de leitura, tanto é que aqui onde moro, é difícil encontrar alguém que goste ler, para discutirmos e trocarmos idéias. As pessoas estão mais preocupadas com o resultado do jogo, o final da novela, e quando você conversa com certos indivíduos, seja pessoalmente ou por msn, dá vontade de chorar pela falta de assunto ou, então, pelos erros cabeludos de português. Leitura melhora o modo de escrever, de falar, de pensar, enfim, é algo do qual nunca vou me separar.

    Feliz Dia Nacional do Livro para todos os amantes da leitura, seja ela do gênero literário que for *_*

    Beijinhus
    Babih Hilla
    http://revolucionandogeral.blogspot.com

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  3. Olá, Caíque! :)

    Olha, só o título do seu texto já nos diz muita coisa. Coisa esta que dá contrapartida a várias discussões, com vários desdobramentos acerta deste assunto que, por fim, vemos que é mais erudito do que muitos pensam.
    O PRECONCEITO é justamente um conceito formado antecipadamente, sem grandes experiências. As pessoas não costumam vivenciar e tentar usufruir daquele momento (de leitura) para que assim possam formar suas conclusões a respeito disso... elas simplesmente falam mal, e não se ajudam. Não ajudam a mudar esse péssimo índice de leitura que ainda persiste, mesmo existindo uma grande parcela de leitores assíduos na qual eu tenho orgulho de fazer parte. E não importa o quanto critiquem, ou o quanto falei do nosso vício – porque há pessoas que fazem isso -, ler é algo maravilhoso, algo singular e de total importância para a vida de qualquer cidadão.
    É lamentável ver que muitos desistem da leitura cedo demais... não sabem eles o que perdem. .-. Porém, cabe a nós, como você mesmo mencionou, tentar mudar esse fato preocupante. Acho que discussões como estas promovem formas de tentar arrumar toda essa bagunça, toda essa divisão de ‘’classes’’ na qual estamos sujeitos a passar. Devemos nos mover para que assim, possamos deixar certas limitações e até os nossos próprios preconceitos de lado... tudo em prol de um país melhor, onde a leitura seja lembrada com vigor.

    Um abraço!
    http://universoliterario.blogspot.com/

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  4. Adorei a postagem e essa conversa vai além do que você escreve, mas apoio que o Brasil ainda precisa melhor em muitas coisas principalmente na leitura e no acesso aos livros.

    E acredito que os blogs ainda são a forma mais fácil de saber sobre livros, pois no meu caso foi por conta de site, rede sociais e blogs relativos a livros que meu desejo pela leitura retornou com força total.

    E vamos juntos lutar pela leitura...

    =D

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  5. Concordo. Concordo plenamente...
    Vivo constantemente isso de que "o brasileiro hoje em dia não gosta mais de ler" e sinceramente acreditava nisso, porém com toda essa blogosfera literária, vi que estavam errados em pontos.

    Há sim muito preconceito, e acho isso horrível, mas fazer o que?! Existem pessoas que me acham louca só por ler, ou gostar de ler, e que dizem não ter paciência alguma para o mesmo. Não tenho problema algum com quem não tem o hábito de ler, pelo contrário, devemos sim respeitar isso... Mas acabar com a literatura do modo como é... Nada

    Gostei muito do post. Mesmo!

    Sofia - http://so-soline.blogspot.com

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  6. @Suellen

    Os blogs literários têm, sem dúvida, desempenhado um papel importantíssimo na tarefa de disseminar a prática da leitura. Eu mesmo acreditava que a ascensão da Internet traria uma geração caracterizada pelo ódio aos livros e à leitura, mas me surpreendi ao me deparar com uma blogosfera marcada, principalmente, por pessoas bastante jovens. Não sei a dimensão do empurrão que estamos dando no sentido de incentivar o desenvolvimento do costume de ler, mas é certamente fantástico receber o e-mail de alguém que diz que, graças ao seu blog, resolveu começar a ler algum livro. Os índices no nosso país são vergonhosos, mas nós, blogueiros e leitores virtuais, temos a chance de fazer uma mudança, ainda que pequena. E eu realmente acredito nisso!

    Obrigado pelo seu comentário :-)

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  7. Excelente reflexão, Caíque!
    Concordo com tudo que você disse!

    Vez por outra eu me engano, achando que esse panorama está sendo realmente modificado, mas a realidade é que ele anda em passos lentos para o progresso. O problema é que ultimamente eu tenho me rodeado cada vez mais de pessoas que apreciam a leitura, e mesmo assim, eu ainda não conheço -pessoalmente pelo menos - alguém que goste de verdade e tenha um ritmo de leitura como o meu. O que é mesmo preocupante pois não estou dizendo que leia tanto assim - com o meu dia corrido hoje em dia, consigo apenas ler em torno 5, a 6 livros por mês, e sinceramente gostaria de que fosse muito, muito mais! Quando era mais nova, e não trabalhava, eu costumava ler em torno de 7 a 8 livros mensalmente. E me espanta, de verdade, quando a realidade bate à porta e eu escuto colegas de trabalho - pessoas bem instruídas - dizendo que não leram um livro sequer esse ano! Nem mesmo Um... como assim? o.o

    Mas uma coisa que vi no seu texto pelo menos estou fazendo... antigamente eu me agarrava muito aos meus livros ao ponto de não emprestá-los a ninguém. Confesso que não mudei a ponto de sair distribuindo e oferecendo eles aos quatro ventos, porém ando bem mais receptiva a esse tipo de ação, e cheguei a emprestar nos últimos dias por volta de 5 livros para pessoas diferentes(lógico que eu fico cobrando quando vejo que a pessoa já está com ele há muito tempo e ainda não devolveu rs) mas mesmo sendo muito apegada a eles, tento avaliar o perfil dos meus amigos, e estou tentanto incetiva-los cada vez mais! Até porque nada melhor do que compartilhar com alguém, algo que achamos muito bom! :)

    Beijos!

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  8. Ual, incrível o texto! E reflete bem simplesmente TUDO!
    Eu sinto na pele esse preconceito com pessoas que lêem e com os livros. Chega a ser engraçado, eu gosto muito dos YA então QUALQUER LIVRO que eu leia todos já vem falando que sou fã de Crepúsculo e começam a falar mal da série pra mim como se fosse me fazer parar de ler o que estou lendo por isso, é tão... sem noção!
    E sabe, fico muito feliz quando consigo tirar esse tipo de preconceito de alguém, assim, no geral contra livros sabe? Já consegui que algumas pessoas passassem a ler mais e isso me deixa contente, realizada, sei lá *-* E tenho certeza que o blog de vocês com certeza ajuda várias pessoas a verem os livros com outros olhos e se não os livros no geral (pq duvido que quem nao goste de ler, procure blogs de livros) pelo menos outros gêneros literários! ^^

    Beijos, Nanda
    www.julguepelacapa.blogspot.com

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  9. Caíque, adorei a reflexão e a estruturação do texto! Muito bem escrito, parabéns!
    Infelizmente é muito difícil modificar um hábito que já é cultural, mas, como você ressaltou, devemos contribuir fazendo nossa parte!
    Empresto sempre que possível meus livros pras pessoas lerem, principalmente quando gosto demais de algum! Mas, infelizmente, esses empréstimos são limitados às pessoas que confio, porque também zelo pelos meus livros!
    Mas, mesmo que não empreste, faço indicações dos livros!
    A leitura é um hábito que tem que ser motivado e inserido aos poucos! De fato, se empurrada logo de uma vez, pode acabar repelindo ainda mais o leitor não acostumado com a leitura!
    Concordo plenamente com o que você disse sobre a leitura influenciar em nossas vidas e construção da mente. Acho que a leitura seja responsável por boa parte do meu senso crítico, não só nesse assunto, mas no meu senso crítico como um todo.
    A leitura é um exercício mental, não só fonte de prazer, e deve ser estimulada!

    Beijos e parabéns pelo excelente post!

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  10. Povo, sobre o empréstimo de livros: eu também sou bastante reticente quanto a deixar meus livros com outras pessoas, mas há muitas outras formas de proporcionar o prazer da leitura aos demais indivíduos! Existe, por exemplo, uma campanha chamada "Esqueça um livro", que propõe que você deixe um exemplar em um lugar público assim que terminar a leitura dele. Claro que não faríamos isso com qualquer publicação, mas às vezes você lê um livro de bolso (ou de banca) que nunca mais vai folhear, e o coitado fica acumulando mofo eternamente na sua estante... Será que esse livro não poderia ser mais bem aproveitado por uma outra pessoa? Além de deixar obras em locais públicos, também há alternativas como a doação de exemplares a sebos e bibliotecas - e até mesmo a amigos! Eu tenho fé na crença de que, às vezes, nos prendemos tanto a essa ideia de amor aos livros que acabamos esbarrando em um egoísmo desnecessário. Será que realmente voltaremos a passar um tempo com aquele livro do Pedro Bandeira que lemos no último ano do fundamental? Será que essa história não pode puxar uma nova pessoa para o universo da leitura? Vale a pena pensar no assunto!

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  11. É realmente muito triste ouvir alguém falar "Eu não tenho preconceito" e no minuto seguinte dizer que a minha vida é chata porque eu leio muito.
    Ás vezes me sinto um ET por gostar de ler e esse é provavelmente o principal motivo pelos quais eu gosto de blogs literários. Eu lembro que não sou a única no mundo e tento acreditar que o ET é quem não gosta de ler.

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  12. Amei!
    Concordo com tudo. É sempre curiosa a maneira que as pessoas olham pra mim e para o meu "excesso" de leitura.

    Realmente precisamos mudar a realidade do país. Ler três livro por ano é acima da média do brasileiro e eu acho isso tão pouco.

    Beijos!!

    Carissa
    www.artearoundtheworld.blogspot.com

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  13. Concordo antes eu tinha um certo preconceito com os livros de capa feia, mas agora vejo que é tudo besteira e o que vale é o conteudo.

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