sábado, 17 de dezembro de 2011

Palavras sobre palavras: conflitos entre identidade e parcerias

Quando, na minha última coluna, eu teci algumas hipóteses sobre o futuro da blogosfera, alguns comentaristas fizeram observações bastante pertinentes sobre os motivos que podem levar alguém a fundar um blog literário. Quando adotamos uma postura realista, percebemos que nem todo mundo dá início a uma página sobre literatura por puro amor à arte, mas que há vários outros fatores envolvidos. Muita gente acredita, por exemplo, que grande parte dos blogs literários existentes só se mantêm graças às parcerias estabelecidas com editoras e autores. O esquema é simples: "Cresci um pouco, consegui algumas parcerias. Estou ganhando livros de graça, tendo apenas que resenhá-los. Por que diabos eu sairia dessa vida?"

Todavia, não é esse grupo ímpar de blogueiros que me servirá de inspiração, hoje. Seria bastante fácil redigir uma crônica em tom condenatório, pregando aos quatro ventos que toda e qualquer página sobre livros deveria ser calcada em pilares de admiração pela arte da escrita e pelo poder das palavras. Contudo, isso transformaria o meu texto em algo previsível e, obviamente, utópico. Nunca teremos uma blogosfera completamente apaixonada e consciente, nesse sentido. Assim, abandonemos essa abordagem comum e dirijamos nossos olhares a uma questão bem mais interessante: como é que essas almejadas parcerias com editoras e autores afetam quem tem um blog e, verdadeiramente, regozija-se ao falar sobre literatura?

Superficialmente, criar um vínculo profissional com uma entidade editorial é uma conquista e tanto. Quando a primeira editora garante um voto de confiança ao seu blog, é como se o seu trabalho finalmente começasse a ser reconhecido, transcendendo o caráter de hobbie e firmando-se como algo mais sério. A euforia do primeiro momento vai embora, mas a sensação de autorrealização é viciante. A partir dessa primeira parceria, o crescimento continua: o número de seguidores aumenta, a quantidade de livros resenhados passa a ser considerável, autores passam a procurar o seu blog em busca de divulgação. Em menos de um ano, já foram estabelecidos laços com mais de dez instituições/escritores, e os livros novos não param de chegar pelo correio. A pilha de leitura, na mesa de cabeceira, assume proporções homéricas e assustadoras. Tudo muito bonito.

Firmar esse sem-número de elos é, entretanto, uma atividade bastante perigosa. Por mais que tais ligações garantam-nos um acesso mais fácil aos livros, a faca das parcerias tem dois gumes, e é preciso usá-la com moderação. O que mais se vê, atualmente, são blogs que se limitam a resenhar os livros enviados pelas editoras, porque não têm outra escolha - quando o blogueiro tenta ler uma publicação diferente, na qual está interessado, já recebeu três lançamentos pelo correio, e precisa analisá-los o quanto antes. Pouco a pouco, a identidade da pessoa por trás da tela vai sendo eclipsada, e a multidão se torna mais e mais homogênea. Garantir um diferencial à sua página torna-se mais difícil, e em pouco tempo uma sensação de sufocamento toma conta do leitor-blogueiro. O agradável volve-se em insuportável.

Esse fato atinge também os leitores. Já me deparei com várias pessoas dizendo que não aguentavam mais ler resenhas de Anna e o beijo francês, por exemplo. Eu chutaria que pelo menos 80% da blogosfera analisou tal livro, temporariamente transformando o nosso pequeno mundo virtual-literário em um cenário ofensivamente repetitivo, visto que as resenhas não eram tão destoantes assim. É difícil convencer um leitor a voltar à sua página quando você se limita a falar sobre aquilo que todo mundo já disse. É a velha questão dos epítetos: para fazer sucesso, você precisa ser nomeado por algum feito. Quem foi o cara que primeiro pisou na lua? Neil Armstrong. Agora, quem foi o blogueiro que resenhou Jogos Vorazes?

A solução, evidentemente, não é rejeitar tudo que as editoras nos oferecem. Como em quase tudo nesta vida, é preciso encontrar um meio-termo, é necessário aprender a dizer não. Nenhum de nós tem a obrigação de resenhar absolutamente todos os livros publicados por aqueles com quem temos parceria. Se lidamos com livros, então espera-se que tenhamos senso crítico suficiente para saber se uma publicação é ou não adequada ao perfil da página que criamos. A chave para a estabilidade encontra-se na construção sólida destas duas identidades: na do blogueiro e na do blog. Se você simplesmente analisa os lançamentos, mas nunca toma a iniciativa de presentear seus leitores com um livro um pouco fora dos padrões, algo inesperado e curioso... Então, quem é você?

13 comentários:

  1. Eita. Cada vez que eu leio essas crônicas de vocês aqui falando sobre esse nosso universo literário mais "comum e chato" acho meu blog. Talvez isso nem seja uma culpa tão grande de todos os blogueiros, nos acabamos nos sentindo na obrigação de resenhar os livros enviados (principalmente os de "tal editora" que ama nos ENCHER de livros, não que eu não goste. rs). Mas realmente o uqe acontece é que todos ficamos re senhando os mesmos livros SEMPRE e isso realmente fica chato toda a vida... Até mesmo pra mim que nem sempre quero ler mil resenhas de um livro que eu já tenha lido x_x, bom. Ainda mais quando eu já tenha resenhado. Ai ai... Isso me frustra um pouquinho, mas não adianta... Eu me sinto meio responsável pelo êxtase inicial de blogueiro que pode ter parcerias e sai fazendo parcerias pra tudo que é lado.. e... bom... agora to lotada de livros! >< Tenho que resenhá-los de qq jeito, mesmo concordando totalmente com vocs. É chato? É chato mesmo... Mas meio inevitável aeiauheiauehiauhe x)

    Beijos, Nanda
    www.julguepelacapa.blogspot.com

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  2. É por isso que eu não quero formar parcerias com muitas editoras e/ ou autores. Por enquanto, UMA é suficiente pra mim. E ainda assim, chegam vários livros de uma vez! :O
    Como você deixou claro na resenha, tudo é uma questão de bom senso e de responsabilidade.
    Não quero me comprometer demais e deixar uma pilha de livros na estante sem saber por onde começar, até pq eu leio devagar e não seria de bom agrado atrasar as resenhas.

    Por outro lado, acho que um blog precisa se atualizar constantemente. E os livros da parceira abrem as portas pra isso.
    Só não acho que um blog deva se limitar exclusivamente a lançamentos.
    Tem muitos livros bons por aí, que qse não são lembrados.
    O que me atrai, particularmente, num blog é a variedade de gêneros, independente do ano de publicação.

    Ótimo texto!

    Bjs ;)

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  3. Olá,

    Gostei muito da forma como você abordou o tema, sem culpar x ou y, mas tratando como uma consequência irremediável do ciclo de parcerias. Bem, não tenho blog, não me senti capaz de fazer um ainda, ainda mais quando entro no seu e sei que escrevo de forma bem inferior e gostar de lê não é só bastante, mas acredito que a maioria das situações ocorram desse jeito. Eu fico um pouco desconfiada ao lê resenhas de alguns blogs, aceito mais dicas de amigos que tenham gostos parecidos ou de alguns blogueiros confiáveis.

    Parabéns pelo texto.

    M.S.

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  4. Oi Robledo!!!

    Gostei muito do seu texto... E isso é verdade mesmo. Eu ainda não resenhei nenhum livro de parceria, até porque são poucas as editoras parceiras que me mandam livros (duas, para ser mais exata). E acho que assim já está bom.
    Eu procuro revesar as minhas leituras, entre um livro de parceria e um da minha preferência. Além do mais, não vou atrás de parceria com editora que não tenha livros que estejam de acordo com o meu perfil... Não faria sentido.

    De qq forma, parcerias são necessárias e importantes para um blog literário e isso não há como negar.

    Beijos, Ká!!

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  5. Oi Robledo!

    Parcerias são sinônimo de reconhecimento pelo trabalho que desenvolvemos com o blog, mas nem sempre isso é verdade, não é mesmo? Fico sempre MUITO feliz quando consigo alguma parceria, mas o triste é que existem Editoras que não verdade estão "pouco se lixando" para o trabalho dos blogs. Aceitam a parceria por aceitar, simplesmente para ajudar a vender. Isso é triste. Acho que isso contribui pra que surjam blogs interessados apenas em ganhar livros e sem compromisso nenhum com os leitores.

    Isso que você mencionou sobre o blogueiro não conseguir ler o que quer pelo fato de ter que resenhar o que chega das Editoras, é de fato verdade, mas o blogueiro só se sujeita a isso se quiser. Por exemplo: tem Editoras que oferecem os livros, então, você aceita resenhar aqueles que te interessam. Já outras Editoras mandam livros sem avisar e sem saber se o blog quer ou não ler determinada obra, ok. Mas aí cabe ao blogueiro ler ou não. Quando recebemos um livro que não nos interessa [Eu(Amanda) e Jéssica] nós o sorteamos no blog pra quem tiver interesse em ler. Acho importante que os blogs tenham suas "políticas" e não simplesmente saia lendo tudo que recebe... Até porque, cada um tem seus gêneros literários favoritos, então, se você recebe um livro que não faz "o seu estilo" a chance de você ler e achar uma droga é enorme, então a resenha não seria fiel.

    Concordo totalmente com o que disse no penúltimo parágrafo. Eu tiro parte da minha semana pra visitar blogs, gosto bastante disso. É não dá pra ler mais do mesmo o tempo todo.

    O último parágrafo disse tudo que eu enrolei pra dizer acima! hahaha [É que leio um parágrafo e vou escrevendo pra não perder o "pensamento" rs]

    Robledo, mais uma vez, parabéns pela crônica!

    Beijos.
    Amanda
    Lendo & Comentando
    ^_^

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  6. Adorei sua crônica.
    É exatamente o que penso em algumas vezes, e como você mesmo falou: a pilha só aumenta.
    Eu nunca gostei de ter uma pilha muito grande de leitura, mas ultimamente é o que vem acontecendo.

    É difícil essa questão de parceria, e por mais qe alguns pensem que é apenas ganhar livros e oba, sabemos que não é bem assim.

    Acho que fazer parcerias sem um limite é loucura. Há blogs que fazem parcerias com editoras de todos os tipos, o que acho totalmente maluco. Eu mesma não faria com uma editora que não se enquadre ao perfil do meu blog.

    Bom, essa questão é realmente questionável.

    Beijos
    http://livroseatitudes.blogspot.com/

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  7. muito bom o post, realmente eh muito chato as vezes ler resenhas do mesmo livro e na parte de comentar, ateh da vontade de dar ctrl c + ctrl v as vzs D:

    --
    hangover at 16

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  8. Fascinante!
    Ótimo texto, eu freqüentemente penso muito sobre isso, porque ás vezes realmente é sufocante a quantidade de livros de parcerias que temos que ler e acabamos não dando conta do recado, mas se não dermos uma pausa e lermos o que queremos, perdemos a nossa identidade, o blog perde a sua essência, porque não era para ser assim, desde o começo era pra ser divertido e não uma obrigação e é assim que eu encaro.
    Igualmente quando se trata de divulgação, tem editora que te manda até o modelo pronto do post, o título, só falta ela mandar quais as tags ela quer que você coloque e eu fico indignada com isso, pelo amor de Deus, somos formadores de opiniões, o blog é nosso tem que ser do nosso jeito!!!!
    Eu não vou mentir e confesso que até cedi aos caprichos de certas Editoras em certos momentos, mas acho que tudo tem limite.
    E não quero que o meu blog cresça, sem eu saber em que exatamente me transformei!
    Amei o texto de coração! =)
    Abraços,
    Camila Leite

    @sonhospontinhos
    www.sonhosentrepontinhos.com

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  9. Oi Robledo!
    Entendo perfeitamente o que você disse. Eu mesma estou fazendo uma resenha atrás da outra de livros de parceiros e quando tento ler um livro diferente sou impedida, pois a pilha das parcerias só aumenta. Para piorar estou em algumas Booktour. Não que eu não goste delas, mas ter que parar uma leitura para poder ler o livro no prazo é meio chato.
    Com tantos livros a personalidade do blogueiro acaba sendo ofuscada. Realmente precisa haver um meio termo. Atualmente tento ler dois livros de parceria e um que eu queira, para tentar equilibrar um pouco essa balança.

    Bjs
    Gabi Lima
    http://livrofilmeecia.blogspot.com

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  10. Ola! A quanto tempo eu nao vinha aqui nao eh?! E qd volto me deparo com um post bem diferente, que por sinal eh o segundo nesse estilo que eu vejo aqui na blogsfera so hoje.
    Achei bem interessante sua postagem e concordo com a sua abordagem.
    Eu pessoalmente nao tenho parceria com nenhuma editora, pois sei que minha vida academica nao me permite e o pouco de tempo que tenho ainda ficar publicado livro "forçadamente"?! Entao preferi nem aceitar, apesar de achar que com moderaçao eh uma coisa muito boa, mas fico feliz ao ver que muitas vezes faço postagens de livro que nao vejo todo dia por ai e sim de livros que que tive/tenho vontade de ler independentemente ou mesmo qd faço de livros "da moda" faço-os ao meu tempo, não necessariamente no clímax do sucesso.

    bju
    letracomasa.blogspot.com

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  11. Cara sua indagação final foi demais. Estou gostando mesmo do LLM

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  12. Robledo escreve maravilhosamente bem. A crônica está muito boa, e bem 'polêmica' para os blogs literários. Parabéns!

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  13. Eu vou ser sincera, já tentei ter um blog mas é tão dificil, eu não sabia o que fazer e de certa forma nem como.
    Não entendo sobre estas parcerias e pra falar a verdade nunca fiz a resenha de um livro, pois o medo de não fazer algo realmente bom e que não seja repetitivo ou uma leitura dificil, sem brilho e estilo unico.
    Lendo sua crônica, pensei muito sobre este mundo em que eu adoraria me encaixar e como tudo isto mudaria minha vida.

    Sua resenha mostrou algo novo e pontos que eu nunca tinha parado para olhar, e quando comecei a ler não acreditei que terminaria, e no final terminei. Você escreve de um jeito direto e cativante, eu gosto, você deveria escrever algo além de resenhas e textos para o blog, você tem talento.

    Abraços

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