quinta-feira, 6 de outubro de 2011

[Resenha] Jandy Nelson - O céu está em todo lugar

Quando O céu está em todo lugar foi trazido pelo correio como cortesia da Editora Novo Conceito, eu o folheei e tive uma primeira impressão negativa. De cara, chamaram-me a atenção a capa - de um minimalismo interessante, mas que beira o lugar-comum - e o fato de que o livro foi impresso em fonte azul. Dei uma olhada na sinopse, e ela também não me pareceu envolvente ou brilhante. O número de páginas era um pouco desmotivante, também. Bom, meus caros: meu nome é Robledo, eu escrevo para o Livros, letras e metas, e, a essa altura do campeonato, eu julguei erroneamente um livro pela capa.

Nossa Lennie Walker é uma garota que ama o clarinete e idolatra o amor de Heathcliff e Catherine. O livro descreve a mixórdia que se torna a vida de Lennie depois que sua irmã, Bailey, morre, e a garota se vê dividida entre um ardor incontrolável pelo ex-namorado de Bailey e uma paixão igualmente intensa por Joe, o novo aluno e esplêndido músico. Nas mãos de um romancista qualquer, essa trama provavelmente enveredaria por questões previsíveis, desenvolvendo-se em um crescendo que todos nós já vimos dezenas de vezes nas comédias americanas. A pena hábil de Jandy Nelson, entretanto, criou uma história tão singular, tão ímpar e tão sem precedentes, que até mesmo analisá-la se tornou uma tarefa difícil.
Pactos. Tantos deles entre nós agora quebrados. E os que nunca foram mencionados, aqueles feitos sem a necessidade de palavras, sem juras com o dedo mínimo, sem nem mesmo nos darmos conta deles?
Toda a qualidade dessa obra reside no estilo narrativo de Jandy. Ponto. A trama não é um primor, mas a autora exerce sua plenitude literária de forma expansiva, abusando dos recursos e das metáforas e do humor. Quando a maioria dos autores cita um nó na garganta, por exemplo, eu geralmente não absorvo essa informação, acabando por ler o parágrafo de forma ininterrupta. Quando Jandy citava uma reação biológica ou um movimento específico, contudo, havia alguma força magnética esquisita que me obrigava a reler cada frase algumas vezes, até que a descrição elaborada pela autora estivesse gravada a ferro e fogo em minha mente. E o pior - no sentido irônico da palavra - de tudo: isso não deixa o livro pesado.
Desço a fim de pegar algo para comer e, quando volto para o Refúgio, sou pega por um desejo tão urgente que preciso cobrir a minha boca para reprimir um grito. Quero que Bails esteja deitada em sua cama, lendo. Quero contar sobre Joe para ela, quero tocar essa música para ela.
Quero a minha irmã.
Quero jogar um prédio em cima de Deus.
Se há algo aprender com o ritmo melodioso de Jandy Nelson, é que o bom escritor é aquele que, pela simples força vigorosa dos vocábulos, transforma uma história simples e bruta em um diamante. Percorrendo os corredores da emoção de Lennie com suas analogias e metáforas, a autora rapidamente estabelece uma relação de proximidade com seu leitor, como se os dois já se conhecessem há anos e tivessem se encontrado casualmente para que Jandy pudesse contar uma história. Alguns escritores, talvez, utilizem a narração em terceira pessoa porque não se garantem quando o assunto é dar voz às emoções de um personagem; Jandy Nelson, todavia, usa a primeira pessoa porque se funde à personagem que criou. Jandy é Lennie.

O único fator que pode eventualmente decepcionar o leitor é a dualidade da obra. Explico-me: ao mesmo tempo em que precisamos lidar com as complicações fúnebres e mórbidas da morte de Bails, deparamo-nos com um sem-número de referências engraçadas e tiradas cômicas. O livro fala sobre uma tragédia e é hilário. É lógico que isso tudo pode fazer parte de um pensamento bem maior: a ideia de que, mesmo quando pressionados contra uma muralha de tristeza e solidão, o sol continuará a brilhar e a beleza da vida continuará a resplandecer. Parece-me que é essa a intenção de Jandy Nelson: permitir que uma flor de riso brotasse no terreno árido da morte. Talvez por isso a morte de Bails não tenha me afetado tanto quanto a divisão de Lennie entre seus dois pretendentes.
Deixo de lado por um tempo o fato de ter me transformado em uma completa ninfeta-prostituta-meretriz-imoral-garota-de-programa-jezebel-piranha-megera-vagabunda, pois acabei de perceber algo incrível. É isso que toda essa excitação quer dizer, o que O morro dos ventos uivantes quer dizer, tudo se resume a essa sensação (...)
Em conclusão: a inocência do livro é apaixonante. Leia O céu está em todo lugar assim (e sempre) que precisar de algo leve, que o ajude a colocar, em paralelo, todas as lágrimas e todas as flores do mundo. Afinal, quem foi que disse que riso e dor não podem conviver?

Título: O céu está em todo lugar.
Autora: Jandy Nelson.
Editora: Novo Conceito.
Número de Páginas: 426.
Avaliação4,5 de 5.

14 comentários:

  1. Adorei a resenha!
    Só digo mais uma coisa: Eu quero! =p

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  2. Ameei sua resenha!
    Quantas vezes não julguei um livro pela capa e me decepcionei ou me surpreendi? Várias, devo admitir.

    Este livro aparenta ser incrível! As palavras usadas, o modo como você descreveu a escrita, fazem o livro parecer perfeito.

    Acho que nunca havia visto um livro com a fonte azul, isso é novidade para mim. Não cansa a vista?

    Beijos e eu preciso ler este livro!

    Bia | Blog Livros e Atitudes

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  3. Quando o Google Reader me passou o link dessa atualização no Livros Letras e Metas, eu li o primeiro parágrafo e tive uma primeira impressão negativa. De cara, como sempre, me chamou a atenção para um texto DDL com impressões pessoais sem objetivo definido, querendo apenas contar que a leitura te prende - o que, como sempre, não revela um raciocínio/reflexão perante a leitura e beira o lugar-comum. Também já conhecia o livro, li outras resenhas e comentei, mas aqui, me precipitei ao avaliar o artigo. Do segundo parágrafo em diante, a escrita é de uma qualidade impressionante. Supera qualquer exepctativa normal para bloggers.

    Mas vamos ao que interessa:
    A novidade, dessa vez, é que Jandy Nelson transforma aquelas história simples e bruta em um belíssimo diamante. Sem se precipitar para comparar Nelson com aquela escritora brasileira cujo nome me foge agora.... Google me ajuda aí... ah Clarice Lispector, eu acho! Mas sem se equivocar, seria um "algo a mais".

    Excelente resenha.

    Att,
    Braunne BR

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  4. Nossa Robledo que resenha!
    É incrível como ás vezes cometemos um erro ao julgar um livro pela capa,pois nem sempre é como pensamos que seria não é? Isso já aconteceu várias vezes comigo.
    Quanto ao livro, estou querendo muito ler. Achei bastante diferente o fato da autora criar uma história com um tema um pouco mórbido mas que ao mesmo tempo seja leve, por ter humor como você mesmo citou.Por esse e outros motivos que me interessei pelo livro.
    Beijos.

    Books e Desenhos

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  5. Robledo, você foi o primeiro que vi que não se encantou com a diagramação do livro e que ressaltou na resenha as partes irônicas e hilárias! Não havia visto ninguém falar sobre isso!
    Sou doida pra ler o livro e acho que o fato de ser tão tocante é pela autora ter se fundido à personagem, como você relatou!
    Concordo com você que talvez tenha sido a intenção de Jandy mostrar ser possível despertar o riso em meio a tragédia!
    Fiquei ainda mais curiosa pra ler!
    Beijos e, pra variar, parabéns por sua excelente resenha!

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  6. Robledo, antes de mais nada preciso te dar parabéns. Essa resenha ficou incrível! Não que as outras não tenham sido, mas na minha opinião essa superou. Depois de lê-la não tem como não ficar com vontade de ler O céu está em todo lugar. Parabéns mesmo!
    Bom, a primeira coisa que me fez apaixonar pelo livro foi a capa, mas, como sempre, não li a sinopse e não fazia a mínima ideia sobre do que se tratava a história.
    No início da sua resenha achei que o livro fosse horrível, mas depois de ler tudo fiquei encantada. Talvez a autora tenha dado essa dualidade para não deixar o livro muito fúnebre.
    Depois dessa resenha esse livro passou para um dos primeiros da minha lista de "futuras leituras".

    Bjs
    Gabi Lima
    http://livrofilmeecia.blogspot.com

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  7. Robledo e suas resenhas maravilhosas *-* Terminei de ler esse livro hoje... E acho que por ter me visto tanto na Lennie achei ele PERFEITO, tipo.. PERFEITO! kkkkkk x) Assim que o vi eu me apaixonei e durante a leitura mais ainda, terminei e fiquei com ele abraçada sem querer soltar, já queria lê-lo de novo :P E sua resenha só me deixou com mais vontade de pega-lo e devora-lo mais uma vez, aoiehaoiehaoieh x) Mas tenho que me segurar né? KKKKKK Enfim... Parabéns pela resenha LINDA e eu estou apaixonada por esse livro, DAOSIHDOAISH '

    Beijos, nanda
    www.julguepelacapa.blogspot.com

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  8. Meu Deus, essas suas resenhas poéticas me deixam sei lá, pasma? UHEUHEUHE... são ótimas u_u
    Nhaaa, é tão bom receber um livro de cortesia né... Aliás, eu gostei da capa.
    E a história parece realmente ótima, pelo menos pela intensidade que você usou ao falar da obra!
    Com certeza é um livro que pretendo ler ^^

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  9. Oi, Robledo :) Qdo vc citou que a Lennie Walker tem um fascínio pelo amor da Catherine e do Heathcliff, eu sorri. E foi um sorriso de satisfação, pq esse casal me encanta demaaais!! *.*

    Eu acho que o bom dos livros é essa sensação de reflexão que temos qdo terminamos de ler. Essa mensagem que fica e nos faz ter certeza que valeu a pena ler tudo. :D

    Bjs ;)

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  10. Oi Robledo!!!

    Mew, adoro sua resenhas, são bem profundas!!!
    Eu estou apaixonada por esse livro desde o momento que vi o kit na caixa de correio de alguns blogueiros... Depois que comecei a ler as resenhas, a vontade só aumentou!!!
    Ainda vou ler, com certeza...

    Beijos, Karina!!!
    Walking in Bookland

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  11. Amigo Robledo, excelente resenha, como sempre. E mais uma vez aprendi uma palavra Hehehe. Hoje foi "Mixórdia".

    Este é o melhor livro que li em 2011, sem sombra de dúvida. E ele me encantou em tudo, desde a diagramação ao enredo, lindamente tecido pela Jandy. Li em dois dias porque não aguentei pra saber como terminava. E os livros que fazem isto comigo, eles sempre vão pro Top 10 *.*

    Quero mais livros da Jandy Nelson, só um é pouco - ela já tem lugar certo na minha estante o/

    Beijão!

    This

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  12. Não sei o porquê, mas não curto muito a capa desse livro. Ainda assim a avaliação foi muito boa, 4,5/5! Fiquei curioso! :)

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  13. "Mixórdia"? What? kk

    bem eu não costumo julgar o livro pela capa, mas as vezes não da pra evitar!!! Não temos culpa se algun livros tem umas capinhas...
    Mais enfim, muitas vezes a história surpreende, este livro no começo me assustou, achei que era algo religioso, e sem graça, mas depois de algumas resenhas percebi que não, a sua foi a mais poética, bem escrita e que não me cansou ao ler!! Quero muito ler este livro, mais o bolso é que não deixa!!
    Mas algo que não posso deixar de comentar na sua resenha é sua opinião sobre dualidade, bem cada livro tem de ter um fator que i deixa diferente de outras histórias então acredito que isso seja um ponto a favor do livro.

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  14. Li esse livro semana passada e achei maravilhoso. Desde toda edição com os bilhetes que a Lennie escrevia e largava por aí, capa, o tamanho da letra, tudo ♥

    Eu gostei dessa coisa dúbia da Lennie, uma hora explodindo de felicidade e a outra quase morrendo de tristeza. Sai grifando muitas coisas durante a leitura.

    Achei o livro muito bem escrito e dava prazer em ler. Tanto que ALOCA aqui ficou enrolando pra chegar no final, porque não queria abandonar a vovó, tio Big e todos os personagens hahahaah estou com saudades deles /aloca.

    Sem contar que fiquei com muita contade de ler "O Morro dos Ventos Uivantes"

    'Dorei a resenha ;-)

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