sábado, 20 de agosto de 2011

Spoilers: um ponto de vista diferente


Todos aqueles que têm o hábito de ler críticas cinematográficas ou resenhas de livros conhecem muito bem a palavra spoiler. O termo define o tipo de informação que é crucial no entendimento de uma história, podendo ser a explicação para um mistério, a descrição de uma reviravolta surpreendente ou até a inserção de um elemento-surpresa no enredo. A blogosfera tem uma espécie de consenso em relação aos spoilers: quanto menos deles uma resenha possuir, melhor a qualidade da análise.


Essa semana, entretanto, o jornal britânico The Guardian - que vive tendo suas resenhas citadas nas capas e orelhas de livros - publicou um artigo assaz curioso, que incita a discussão sobre os spoilers, mas partindo de uma óptica completamente contrária àquela que se espera encontrar um texto como esse. Segundo o artigo, a explosão de sites fornecedores de detalhes confidenciais e o surgimento de trailers cada vez mais explícitos é responsável por fazer com que nós sempre saibamos o que esperar de um filme. Contudo, questiona o jornal, será que essa tendência à explicitação pode nos ser favorável? A pesquisa britânica é predominantemente direcionada aos filmes, mas a minha intenção, aqui, é adaptá-la ao nosso universo literário.

Segundo o artigo, quando sabemos a solução do mistério por trás de um longa-metragem (quando somos capazes de dizer, por exemplo, se o personagem principal vai ou não morrer), recebemos o poder de direcionar a nossa consciência a detalhes mais abstratos, absorvendo a beleza da obra em sua plenitude, não negligenciando os detalhes de produção, trilha sonora e ideologia por trás das cenas. Esse tipo de raciocínio vai inteiramente de encontro a toda a nossa filosofia, tendo em vista a nossa tendência à supervalorização do enredo - que, de acordo com o Guardian, não é tão importante assim, no final das contas. Se o desenrolar da história fosse tão crucial, qual seria a coerência em ler um livro duas vezes, se você já sabe o que vai acontecer?
O que um spoiler faz é permitir que você tire o enredo do seu caminho e possa ver a coisa se desenrolar com uma atenção maior à esperteza, à beleza, ao comentário sobre a condição humana, ao exame da vida e tudo mais. Até mesmo apreciar a maneira como a trama é utilizada para conduzir essas questões, uma vez que você entende qual é a história.
O texto possui um sem-número de argumentos a favor da divulgação de spoilers, mas também se compromete a mostrar o reverso dessa moeda. A exuberância de sites cujo principal objetivo é revelar o elemento-chave de alguns filmes, por exemplo, tem tornado mais difícil a vida de vários cineastas e roteiristas;  as famigeradas redes sociais têm exercido impacto semelhante. A autora do artigo diz nunca ter visto um filme com uma reviravolta chocante desde a ascensão do Twitter, do Facebook e do Youtube: o tráfego de informações tornou-se tão descontrolado que é difícil não esbarrar, ainda que acidentalmente, em um post que ofereça ao leitor um detalhe supostamente confidencial de uma obra de arte.

Quando aproximamos essa questão do sub-universo literário, imagino que as nossas opiniões sejam bastante divididas - principalmente porque o nosso cardápio tem uma variedade estonteante, e cada livro é um livro. Eis um exemplo bastante tangível: todo mundo sabe o que Brás Cubas vai narrar em suas Memórias Póstumas, mas muitos leem o romance machadiano duas, três, quatro vezes - isso porque o essencial não está no enredo em si, mas sim no desenvolvimento da crítica, na análise psicológica dos personagens, na percepção de sutilezas, metonímias e ironias. Por outro lado, ler um clássico romance policial da Agatha Christie pode perder toda a graça se você sabe, desde a primeira página, quem é o responsável pelos crimes. A Rainha do Crime, assim como muitos de seus discípulos, criou uma produção literária mais focada na velocidade e no suspense do que na profundidade e na reflexão - e, nesses casos, ler um spoiler é praticamente assinar o atestado de óbito da obra.

Essa é uma questão, no mínimo, polêmica. A ferida que o Guardian insiste em pressionar está intrinsecamente relacionada ao nosso dia-a-dia nessa blogosfera literária, e muito me aprazeria saber a opinião de vocês sobre essa delicada discussão. Até que ponto um spoiler pode funcionar como um elemento de direcionamento, uma forma de fazer com o que o leitor preste atenção a detalhes menos superficiais? Será que estamos agindo certo ao condenar universalmente essa prática, sem refletir sobre a importância do enredo nos livros que estamos lendo? Nosso mural de comentários está à espera da sua valiosa opinião, meu amigo leitor.

12 comentários:

  1. Oi Robledo!

    Sem dúvida essa discussão toca em uma ferida delicada. Acho que depende do enredo que temos e da quantidade do que se pode ser revelado. Se for uma estória que tem muito mais daquele simples aviso ou revelação numa resenha, aí fica sem problema utilizar deles. Mas quando aquilo é a grande chave-surpresa do enredo, aí é de um mau-gosto terrível. Concordo que spoiler podem ser revelados para evitar que o leitor se perca em alguns acontecimentos que não irã contribuir para a história, mas - como disse - o leitor não pode começar a leitura já sabendo quem é o assassino, quem é o anjo mal ou quem é o vilão. Os resenhistas têm de ter jogo de cintura para capturar tudo aquilo que pode ser dito e amarrar bem suas afirmações, para que nada fique explícito para o leitor, nada que vá levá-lo a descobrir o elemento antes do necessário. Ótima postagem, ótimos argumentos!

    - Matheus, Bobagens e Livros

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  2. Eu odeio spoilers. Eu odeio até aqueles spoilers que não são spoilers. Os do tipo "sinopse". Nas resenhas sempre pulo essas partes, dos livros que já sei que vou ler, ou que há uma possibilidade. Mas é claro que sempre leio (mais ou menos) as sinopses de livros que não sei ainda. Pra citar um exemplo, no livro O Guardião de Memórias, um personagem faz um parto de gêmeos. Ele também é pai das crianças que nasceram, só que uma nasceu com síndrome de down. Ele mente pra esposa dizendo que a filha morreu. E isso tem dizendo na sinopse!! Não é nem spoiler pra história, mas gosto quando eu pego um livro que nem sei pra onde vai e me impressiono com cada coisa.
    E se for pra observar o que levou a história acontecer de uma maneira, não há nada demais em assistir/ler o filme/livro mais de uma vez.

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  3. Realmente não me importo de ler spoilers. Acho que o único que não suporto (mesmo) ler é sobre o final. Daí, acabou. rs'
    Mas fora isso, não me importo. Pois se quero mesmo ler a obra, não faz diferença ver alguém resumindo-a. O autor fez diferente, será diferente. ;)

    Bjs.
    www.primeiro-livro.com

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  4. Não acho que o desprezo do enredo deva ser visto como uma boa atitude. Sim, estar atento à trilha sonora e detalhes de produção é importante. Mas não é necessário desprezar o enredo.

    "Se o desenrolar da história fosse tão crucial, qual seria a coerência em ler um livro duas vezes, se você já sabe o que vai acontecer?"

    Leia o livro duas, três vezes; assista ao filme quantas vezes precisar. O enredo é parte da obra tanto quanto a ideologia por trás dele, ainda que não seja um enredo genial ou que não seja o foco e deve receber sua parcela de atenção.

    Sou chato com spoilers e pretendo ser assim FOREVUR. :D

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  5. Oi Rô, dsculpe te chamar assim, mas tenho o costume de diminuir os nomes...=)
    Bem, eu fiz poucas resenhas até agora e sempre me preocupo com o quanto irei revelar para os leitores, afinal, devemos nos preocupar em dizer coisas que os deixem instigados a lerem, sem revelar detalhes que possam deixá-los decepcionados, pois se não a leitura não valerá a pena, já que ele conheceu toda a história...
    Eu gosto de sinopses e resenhas assim, que revelem pouco, mas causem impacto e curiosidade e se por ventura revelarem o final, acho que devem rever os conceitos de resenha, pq na verdade o intuito da resenha é informar sem revelar o"UP" da história em questão, se não não seria resenha e sim resumo. Por isso a importância de escolher bem o tipo de spoiler que se colocará na tal resenha/sinopse. Acredito que seja esse o ponto fundamental para o sucesso ou não da obra, ou seja, qntos leitores o livro conseguirá ter com a leitura de uma resenha ou sinopse.
    Gostei do post, ficou quase um artigo! Vc realemnte escreve muito bem. Parabéns! Beijin.=)

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  6. Oi, Robledo :) Minha opinião é contraditória. Eu não curto saber de acontecimentos reveladores de livros e filmes, pois assim não tem graça de ler e/ ou assistir. Muito menos qdo se trata de literatura/ filme policial. Ora, como vou levantar minhas hipóteses se o spoiler entregou a trama? :/
    No entanto, (contraditoriamente) eu curto spoilers de séries favoritas. xD Fico naquela ansiedade de saber o que vai acontecer. Só não sou a favor qdo o spoiler revela detalhes do fim do episódio, por exemplo. xD

    Sobre o comentário lá no blog:

    Eu cheguei a pensar em Romeu e Julieta, Robledo, mas não tenho simpatia pelo casal. Não curto Shekespeare. Acho que o único livro dele que gostei mesmo foi "Sonhos de uma noite de verão". Tvz por estar mais voltado pra comédia. :x
    E mentira que você não assistiu "Titanic"??? O.O
    Eu pensei que essa possibilidade não existisse mais! xD Corra, assista e depois me conte, viu? :D

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  7. Eu penso que spoiler é muito relativo no sentido de que o que pode ser spoiler para mim pode não ser para outra pessoa.

    "A Rainha do Crime, assim como muitos de seus discípulos, criou uma produção literária mais focada na velocidade e no suspense do que na profundidade e na reflexão - e, nesses casos, ler um spoiler é praticamente assinar o atestado de óbito da obra."

    Nesse ponto eu concordo, também vai muito do livro, já fiz isso em um livro da Agatha e perdeu todo o sentido da leitura.

    "Se o desenrolar da história fosse tão crucial, qual seria a coerência em ler um livro duas vezes, se você já sabe o que vai acontecer?"

    Acredito que seja pelo gosto de reviver as cenas, as situações prestar a atenção em detalhes que antes por causa da rápida leitura ficaram despercebidos.

    Adorei o post, isso dá um belo assunto para debate. Aliás eu não me importo com spoilers, masss desde que eles não contem o final da história.

    Beijos
    BabihGois
    http://babihgois.blogspot.com

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  8. Até concordo com a parte de que quando você já sabe o que vai acontecer, você começa a prestar atenção nos detalhes do enredo, mas nada supera a emoção de descobrir um fato relevante na história. Spoilers tiram totalmente essa sensação e, pra mim, diminuem a vontade de ler o livro/ver o filme :/ E nada melhor do que reler um livro para descobrir coisas que você não prestou atenção na primeira leitura ^^

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  9. Eu sou estranho... Enquanto que para a maioria dos leitores receber spoiler e motivo para “matar”, para mim não é nada demais. Digo, não me incomoda. Às vezes acho que até me convida a querer ler o livro ainda mais...

    Agora, concordo com a Amanda, saber o final, isso sim incomoda.

    Mas, ainda que eu não me importe em receber spoilers, não tenho o direito de fazê-lo, pois algumas pessoas gostam de ler o livro sem saber nada do mesmo, para que haja surpresas.

    Este é um assunto que divide opiniões...

    Robledo, ficou muito bom o post! Parabéns!!!

    Um grande abraço!
    Jonathan_HGF

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  10. Olá, Robledo!

    Esta é uma discussão interessantíssima, na qual nunca vi um blog tratar sobre. Contudo, muito me agrada ver que você nos deu este acervo de informações, que serviu como porta de entrada para um debate que envolve a todos, tanto blogueiros como leitores assíduos. :)

    Bem, é bacana ver o lado positivo (nas entrelinhas) dos spoilers, até porque precisamos estar aberto a todos os tipos de opiniões e teorias propostas. Mas ainda sim, não sou total a favor deles em resenhas ou artigos críticos, e vou lhe explicar por quê.

    Um spoiler, muitas vezes, pode ser uma informação crucial para a história (coisa na qual você está cansado de saber). Acontece que sou do tipo de leitora que ama surpresas. É bom demais quando um livro te impressiona, te choca, te faz sentir coisas inexplicáveis... eu realmente não me importo com sinopses, descrições, comentários sobre estrutura, opiniões diretas e afins, mas contar fatos ou acontecimentos importantes extrai a magia do livro... magia esta que o leitor poderia estar vivendo no momento da leitura. Se a pessoa for ler algo sabendo de tudo, ou quase tudo, a magia simplesmente some. Não há surpresa, emoção... não há nada do tipo. Entretanto, isso é algo relativo... acredito que cada leitor tem uma forma diferente de ver ou não uma informação como spoiler, o que torna esse assunto ainda mais polêmico e controverso.

    No mais, não tenho ''frescuras''. É bacana encarar uma leitura sabendo do que está por vir, mas sem grandes exageros, claro. Uma resenha, a meu ver, precisa ser crítica e analisada de acordo com o seu olhar crítico sobre determinada história... não é preciso contar TUDO o que há na mesma, muito menos sua essência. É necessário apenas transmitir sua conivência e relação com o livro... saber as emoções vividas com o enredo, sem mais.


    Um abraço.
    http://universoliterario.blogspot.com/

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  11. Robledo,
    Apenas para variar, entro aqui e deparo-me com uma excelente dissertação sua, muito bem argumentada, a propósito.
    Primeiramente, devo dizer que, em partes, não posso deixar de concordar com o que a Francielle citou acima. Alguns spoilers acabam tornando-se cruciais na obra e apenas contribuindo para a compreensão do texto. O leitor de "Romeu e Julieta", por exemplo, já dá início à narrativa sabendo que ambos morrerão ao fim, o que não o impede, de qualquer forma, de conhecer os meios, de sentir o romance shakesperiano em seu tom mais agudo. Assim como em "Memórias Póstumas de Brás Cubas", como você mesmo citou.
    Em compensação, não acredito que a ausência de um spoiler, a surpresa da obra impeça o leitor de apreciar a beleza, a grandiosidade que ali existe, os detalhes mais abstratos que não realmente necessitam de uma releitura.
    Há muito que se ver, porém, como boa leitora e adoradora de surpresas, de momentos inesperados que nos assaltam as emoções, sou desforável aos spoilers.

    Beijos,
    Ana - Na Parede do Quarto

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  12. Adorei o tema e a maneira de como você o desenvolveu, o texto está ótimo!

    A visão lançada pela revista é certamente polêmica, interessante e diria que possui uma grande verdade em si.
    Mas continuo não sendo favorável a spoilers.
    Primeiro, não acredito que seja o fator surpresa o responsável por me fazer ler um livro, e, assim, a lógica de que, se o fosse, não haveria motivo para releituras, cai por terra. Mas eu gosto de, na primeira vez que leio um livro ou assisto a um filme, me emocionar e me surpreender da maneira que apenas a primeira vez te permite.
    Depois, eu adoro reler livros. Sempre acho válido por me possibilitar uma visão diferenciada da obra, captar detalhes que da primeira vez não foram possíveis, independente de não me surpreender por já conhecer o desenrolar da história.
    E, por fim, é diferente quando você sabe o que vai acontecer porque você leu o livro do que por ter lido em algum lugar alguém contando, acho desrespeito a quem prefere não ler quando a pessoa simplesmente fala sem avisar que pode conter spoilers. Ela tira sua opção de escolher entre saber ou não um fato relevante.
    Concluindo, na minha opinião, acho válido ler e reler um livro, quando possível. A primeira vez por causa das emoções que o livro desperta, a segunda (e outras) para uma melhor análise da obra!

    Adorei o post, parabéns!

    Beijos!

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