sábado, 4 de junho de 2011

[Resenha] Ana Paula Bergamasco - Apátrida

Você já deve ter ouvido comentários acerca desse livro. Trata-se, em suma, de uma das obras nacionais mais destacadas e citadas dos últimos dois ou três anos. Quase que em sua integridade, a blogosfera literária se dedicou a ler o romance de Ana Paula Bergamasco e a publicar suas análises críticas sobre Apátrida. A maior parte dos blogueiros apaixonou-se pela história de Irena, uma polonesa que, com a chegada da Segunda Guerra Mundial, tem a sua vida transformada em um inferno; de fato, no Skoob, 83% dos leitores garantiram nota máxima a Apátrida, e muitas resenhas destacaram a emoção e a maestria com as quais a autora conduziu sua narrativa de dor e sentimento. Pois bem. Graças ao booktour organizado por Ana Paula Bergamasco, eu também tive a oportunidade de conhecer a saga de Irena. E, cá entre nós: o livro não é essa perfeição toda, não.

É lógico que a autora fez uma excelente escolha temática. Particularmente, eu já li vários livros que falavam sobre a opressão sofrida pelos judeus durante a ascensão e o regime de Hitler, mas Apátrida foi a primeira obra que me aproximou da realidade igualmente dura dos poloneses, durante esse período sangrento. A Segunda Guerra Mundial é um período histórico que, se abordado corretamente, é capaz de atacar o leitor, machucá-lo, fazer com que ele sofra. A exposição do quadro de agruras às quais as chamadas "raças inferiores" eram submetidas tem um poder de expressão fortíssimo, principalmente quando os eufemismos são deixados de lado e nenhuma peneira é usada para tapar o sol. Quanto mais cru, mais forte.
- Vocês pensam que estão livres? Não estão não. Crianças e adultos são alvos de experimentos terríveis aqui. Eles mutilam as pessoas e passam ácido para ver o resultado. Fazem experimentos com remédios para esterilização em massa. Arrancam olhos, amputam membros, cerram ossos, congelam e afogam pelo bem da ciência alemã. Entre nós está o mais terrível deles. Ele está brincando de ser Deus com as crianças de vocês. Sabem o apelido dele? Anjo da Morte!

Assim, podemos afirmar sem pestanejar que, durante a estadia de Irena em um Campo de Concentração, a autora atinge seu nível máximo de emoção, e é realmente impossível largar o livro nesse momento. O quadro de morbidez desenhado por Ana Paula Bergamasco torna-se vívido e inapagável - e, contraditoriamente, não há como se afastar dele. Durante toda a obra, a autora alterna presente e passado: em um capítulo, Irena nos diz sobre sua vida pós-guerra e sua estadia no Brasil; no outro, retoma sua infância, sua juventude, sua adolescência sonhadora, suas paixões primaveris. Acontece que, no meu caso, eu não conseguia dar atenção às travessuras dos filhos de Irena, sabendo que anos antes eles estavam sob a ameaça de um médico-monstro. Não sei ao certo se foi essa a intenção da autora ou se esse é apenas um desenrolar natural dos fatos, mas o passado de Irena é MUITO mais interessante do que o seu presente.
A cada comemoração da década do término da Segunda Guerra há eventos em vários países para lembramos sempre da insanidade que esta foi. Porque embora ela nos seja uma tortura, é necessário que a mencionemos para que as gerações futuras não se esqueçam do que ela significou, como retrocesso, na nossa Humanidade.
Aliás, nem todo o passado me pareceu muito fascinante. Nos exemplares do booktour, algumas páginas foram separadas para que os leitores deixassem suas impressões sobre o romance e lá eu destaquei que parece-me que a autora só pegou o jeito da coisa lá pela segunda metade do livro. Houve um momento da história em que eu não sabia dizer ao certo quem eram determinados personagens (eram muitos, e alguns até homônimos), tamanha a confusão à qual fui submetido. O final torna-se melhor justamente por ser focado em poucos personagens, sem que você tenha que deglutir um sem-número de histórias paralelas e irrelevantes.

Também na primeira parte, é absurda a presença de erros de regência, concordância e ortografia. O livro merecia uma revisão muito melhor. Não que isso interfira diretamente na história, mas, pelo menos nas minhas avaliações, um livro nunca vai ganhar 5* se for mal revisado - afinal, é até mesmo uma falta de respeito com o leitor. Em Apátrida, isso se somou a uma série de outros fatores que, aos meus olhos, são negativos - personagens demais, muitos períodos curtos, um melodrama em algumas partes - e, no fim das contas, eu lamento, mas não posso dar ao livro a mesma avaliação que 83% dos leitores deram. Trata-se de um livro passional, fruto de uma pesquisa histórica extremamente bem feita, mas esses pequenos deslizes vão, pouco a pouco, consumindo o potencial da obra; quando você vai ver, terminou de ler e prestou muito mais atenção ao "Austro-Ungaro" ou ao "intensão" do que às cenas de reencontro e redenção.

Em síntese: tema fantástico. História promissora. Pequenos erros numerosos e comprometedores demais.

Título: Apátrida.
Autora: Ana Paula Bergamasco.
Editora: Todas as Falas.
Número de páginas: 338.
Avaliação: 3 de 5.

18 comentários:

  1. "uma pesquisa histórica extremamente bem feita" Concordo!

    Às vezes eu me perdia mesmo nesses acontecimentos paralelos e não sabia quem eram os personagens, rs.

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  2. "eu já li vários livros que falavam sobre a opressão sofrida pelos judeus durante a ascensão e o regime de Hitler"

    Eu ainda não li nenhum, mas acredito que meu irmão iria adorar, apesar de não gostar de ler, ele se interessa pelo assunto ^^

    A história me parece promissora, mas os erros e muitos personagens meio que desanima. Parabéns pela resenha.

    Beijos
    BabihGois
    http://babihgois.blogspot.com

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  3. eu adoro livros com esse tema, me sinto dentro do livro, me entrego a estória dos personagens, e acabo aprendendo muito também.

    tudo por um livro - http://issotudoporumlivro.blogspot.com/

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  4. Robleeedo, bom, eu já falei o que acho sobre Apátrida pelo Facebook, e gostei bastante, eu consegui ignorar os erros e tudo mais, porque eu realmente queria ler algo da 2ª guerra e eu sou apaixonada por tudo que envolve romance, então, sei lá, foi uma combinação perfeita no momento que li, *----*
    Realmente algumas partes são cansativas, mas, vc ccntinua lendo porque quer saber o resto UAHUHAUHUA
    E tem umas frases mtmtmtmt boas, frases e partes muito marcantes. Como a do acidente que o Jan teve, sobre a música que era o único meio de fuga dele. Eu acho essa cena linda, uma das mais perfeitas =)
    Eu concordo com tudo que você falou, concordo mesmo, mas, ainda sim, não consigo deixar de gostar do livro, pq como já disse, era o que estava procurando!!
    Ótima resenha como sempre :D
    E diz para o Caíque que nas férias, quero ver muitos vídeos dele por aqui, vídeos ou vídeos-resenhas e fala para ele que tirei a ideia do video-resenha daqui mesmo, e do blog aprendiz de cinema, da etiene :D
    Espero que vocês assistam ao meu vídeo falando do livro "Em Chamas" *-*
    Beijos e até!

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  5. Não tenho muita vontade de ler esse livro, imagino que seja bom, mas não costumo gostar de livros que abordam essa temática, então...
    Não posso deixar de comentar que essa capa é linda :D
    Ótima resenha :)
    Beeeijos

    Marina - http://distribuindosonhos.blogspot.com

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  6. Olá, Robledo!
    Adorei a sua resenha e sinceridade no ponto de vista expressado sobre a história, vejo muitos comentários positivos a respeito deste livro e espero ter a oportunidade de conferir esta emocionante história algum dia rs.
    Entendo que livros assim mexem com qualquer um, ainda mais retratando os horrores do Holocausto.
    Bjos.

    Mariana Ribeiro
    Confissões Literárias.

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  7. Este comentário foi removido pelo autor.

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  8. Robledo, como sempre, prezando pela sinceridade. Sinceridade mesmo, e eu prezo duplamente por isso ao ler uma resenha.
    Li muitos comentários positivos a respeito de "Apátrida", mas muita gente acaba deixando de ressaltar essas partes técnicas que, querendo ou não, são SIM, importantes num livro.
    Uma obra bem feita é o conjunto do trabalho de todos os profissionais. Naturalmente, o escritor é o principal e acaba levando toda a culpa no cartório. Assim como você, sou bastante crítica e abomino alguns erros de ortografia.
    Sou totalmente favorável a você ter diminuído um pouco sua nota na avaliação, pois isso, de certa forma, auxilia a autora a melhorar para que obtenha mais sucesso em obras futuras.
    Sua visão, entretanto, ainda não me tirou a vontade de ler Apátrida e acho que a Ana Paula soube interpretar bem. Ela, com certeza, adquire aqui, com uma crítica construtiva, o desejo de melhoria em seu livro.
    Parabéns pela resenha!

    Beijos,
    Ana - Na Parede do Quarto

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  9. Oiii, pois é, temos que ser sinceros né? rs.
    Vou receber o meu da booktour essa semana acredito, ou na próxima, então estou um pouco ansiosa pra ler *-* hihi. Espero que eu goste :x
    Até mesmo porque é um tema que eu particularmente gosto muito *-*

    Beijos

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  10. Gosto demais das suas resenhas Robledo, mas fiquei decepcionada com esta. Primeiro, vc não se informou direito a respeito de quando o livro foi lançado e generalizou. Apátrida foi lançado em setembro de 2010, portanto, está há pouco tempo rolando pelos blogs. Outra coisa, independente de ter gostado ou não do livro, vc deveria fazer uma resenha diplomática. E vc sabe muito bem que nós blogueiros podemos alavancar um livro, como também acabar com ele. Querendo ou não, somos formadores de opinião.
    Concordo com vc a respeito da revisão, onde poderia ser solucionado esses pequenos problemas, porém, quanto a história não há o que criticar. Além da pesquisa histórica extremamente bem feita, a história de Irena é inspiradora, em meu ponto de vista. Além de qu não ter me perdido em nenhum ponto da história, afinal, estava tudo muito bem delineado, passado e presente, além de personagens muito bem estruturados.
    É claro que vc tem direito a sua opinião, só que acho que vc se prendeu a coisas muito pequenas para demonstrar seu desagrado.

    Abraços

    Eliane (Leituras de Eliane)

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  11. Oi Robledo!

    Adorei a sua resenha. Soube muito bem destacar o que não gostou com explicações concisas, adoro suas resenhas e até me inspiro para fazer as do "Bobagens e Livros". Aliás, tem votação lá para um prêmio de literatura que estou organizando.

    Apátrida está concorrendo na categoria "Melhor romance brasileiro".

    - Matheus, Bobagens e Livros

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  12. Olá!

    Esse é um livro que eu gostei muito, pois eu sou fascinada por enredos que abordam o Holocausto, o nazismo, etc, porque sempre vale lembrar as atrocidades daquela época, e isso sempre me faz releflir e claro, me emocionar.

    Quanto aos erros de revisão, sinceramente não me incomodaram tanto, é claro que não deveria ser passado batido, mas felizmente não atrapalhou minha leitura. E quanto a história, em nenhum momento eu fiquei perdida, achei o o livro bem escrito. Gostei muito, ou melhor, adorei.

    Se você gosta muito de livros desse gênero, recomendo que leia também O Arquiteto do Esquecimento. É de um ator nacional também, Marcos Bulzara.

    Beijinhos

    Ler e Almejar

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  13. Não é meu gênero favorito, mas me indicaram esse livro e não sei ainda se vou ler... Eu gosto muito do período da Segunda Guerra, não sei porque mas tenho o "pé atrás" com esse livro.
    A capa dele é maravilhosa, eu achei linda mesmo *-*
    Parece interessante apesar dos erros...
    A resenha ficou realmente muuuuuuuito boa!! Adorei

    Beijinhos
    Jessie
    http://twitter.com/blogLLM

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  14. Essa história realmente me interessou, mas o que ainda me mantém afastada deste livro são os pontos negativos que você citou, e o maior deles é a revisão mal feita. Livros não podem, em hipótese alguma, trazer erros de ortografia, concordância e blás, porque, em tese, ele é a nossa referência do bom uso do idioma. Vai lá pra baixo da wishlist, bem pra baixo mesmo.

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  15. Olá Robledo e Caíque!
    Faz muito tempo que não comento no "Livros, Letras e Metas". Esse sumiço deve-se principalmente, ao colégio, aos trabalhos e às provas... Mas, já que estou de férias, irei comentar em várias resenhas do blog, ok?
    Espero não sumir mais, e comentar sempre que possível!

    Vamos lá...
    Ontem um entrei em uma promo para ganhar um marcador de Apátrida e já que estava passando pelo blog, resolvi ler a resenha.
    Bem, leitura sobre 2ª Guerra não é muito a minha cara. Já li alguns livros, não foram os mais "terríveis", mas foram bem angustiantes.
    Foi um período muito horrível para quem o vivenciou, e ler sobre ele é difícil.
    A sua resenha foi ótima, tanto é que pelos erros que você citou, com certeza se eu tivesse lendo Apátrida ficaria pensando "Mas, 'Austro-Ungaro' não se escreve 'Austro-Húngaro'?", rs
    Não sei se um dia lerei esse livro, mas quem sabe daqui a alguns anos?

    Beijos,
    Mariana,
    http://lereconhecer.blogspot.com/

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  16. Oi, Robledo, cheguei aqui por acaso, pelo blog da Lizzie.

    Geralmente quando chego num blog novo assim, logo olho os temas dos posts da página principal e depois as resenhas de livros que já li pra ver se o gosto é compatível com o meu e se repararam nas mesmas coisas que eu (negativas, geralmente).

    Vim logo pra essa que foi o primeiro livro que abandonei desde que comecei a ler diariamente.

    Adorei sua sinceridade na resenha (resenhas sinceras são o que há rs) e mais sinceramente ainda?
    Achei esse livro MUITO CHATO. Uma pena que depois a história engrena mas o começo foi arrastadíssimo pra mim, por contar muitas coisas irrelevantes do passado de Irena. Teve uns 3 casamentos e enterros idênticos! E os travessões no "pé" da linha em todos os diálogos da edição que eu li me desanimaram. A autora não usou muito da ficção pra tornar a história mais interessante, tudo pareceu muito real. E já que não é uma história baseada em fatos reais (apesar de ser num período histórico real) achei um desperdício.

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